Educação de Jovens e Adultos

Educação de Jovens e Adultos

Este terceiro tópico, que complementa os dois anteriores sobre a Educação Popular, compreende três momentos distintos. Inicialmente, apresentam-se movimentos remanescentes do início dos anos de 1960 que se mantiveram praticamente até o final da década (Cruzada Ação Básica Cristã e SIREPA – Sistema Radioeducativo da Paraíba) e algumas iniciativas mais localizadas, vigentes na virada dos anos de 1960 para 1970 (Programas de Alfabetização Funcional no Nordeste e Projeto João de Barro, no Maranhão). Em segundo lugar, são apresentados os programas federais hegemônicos nos anos de 1970 e 1980 (MOBRAL, Ensino Supletivo e Fundação Educar), período mais forte dos governos autoritários. Em terceiro, apresentam-se experiências que tiveram início do final dos anos de 1970 ou início de 1980, durante a abertura democrática, inaugurando um novo modo de agir do estado na educação de jovens e adultos: Programa de Educação Juvenil, hoje Programa de Educação de Jovens e Adultos, do município do Rio de Janeiro; MOVA – Movimento de Alfabetização, criado na gestão de Luíza Erundina na Prefeitura de São Paulo e Paulo Freire, nos dias atuais com expressão nacional; Secretaria de Educação de Jovens e Adultos e MOVA de Porto Alegre e respectiva região metropolitana; além de duas experiências realizadas por universidades: Programa de Alfabetização de Funcionários da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Projeto Escola Zé Peão, criado em 1990 pelo Centro de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) em convênio com o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário de João Pessoa.

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O golpe militar de março de 1964 desestruturou praticamente todos os movimentos de cultura e educação popular que estavam em atividade e em franca expansão. Como instituição, apenas o MEB – Movimento de Educação de Base sobreviveu, pela cobertura da Igreja Católica. Algumas práticas, como a alfabetização realizada pelo Sistema Paulo Freire, foram mantidas, em formas isoladas e reservadas, até a promulgação do Ato Institucional, em dezembro 1968.

No entanto, uma experiência de caráter bastante conservador, a Cruzada de Ação Básica Cristã, mais conhecida como Cruzada ABC, foi reforçada após o golpe. Suas ações expandiram-se imediatamente no Grande Recife e foram logo após implantadas nos estados de Paraíba, Sergipe, Ceará, Alagoas, Rio de Janeiro e Guanabara, com recursos da Aliança para o Progresso e do governo brasileiro, mais doações de entidades privadas nacionais e internacionais, passando a atuar nas áreas que haviam sido influenciadas pela proposta de Paulo Freire e onde haviam sido instalados sindicatos rurais.

Mesmo secundarizado pela Cruzada ABC, o SIREPA – Sistema de Escolas Radiofônicas da Paraíba, criada em 1959, a partir do projeto SIRENA – Sistema Rádio Educativo Nacional, do MEC, conseguiu sobreviver até 1969, basicamente por limitar-se à alfabetização e por contar com apoio do governo do estado.

No elenco de novas ações nesse período, o governo do estado do Maranhão, aproveitando-se em parte do quadro profissional remanescente do MEB, criou, em 1967, o Projeto João de Barro, tendo em vista atender à alfabetização de adolescentes e adultos não escolarizados e implantar uma rede de escolas nas áreas rurais. Em 1974 foi substituído pelo MOBRAL.

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Nos dois anos seguintes ao golpe, o Governo Federal, além do relativo apoio à Cruzada ABC e ao MEB, praticamente ignorou a educação de adultos. Apenas de 1967 é apresentada nova proposta de alfabetização e adolescentes e adultos, atendendo à iniciativa da UNESCO de comemorar o dia 8 de setembro como Dia Internacional da Alfabetização. Vários decretos foram assinados em 08/09/67, criando um grupo interministerial para estudo e levantamento de recursos destinados à alfabetização; instituindo a Rede Nacional de Alfabetização e Educação Continuada de Adultos, que envolvia as emissoras radiofônicas e televisivas; prevendo a educação cívica e ações de alfabetização nas instituições sindicais e o uso da televisão. Complementando os decretos citados, em 15/12/67 foi promulgada a Lei n. 5379, pela qual é aprovado o Plano Nacional de Alfabetização Funcional e Educação Continuada de Adolescentes e Adultos e criado o MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização, como fundação sediada no Rio de Janeiro. Em 1968/1969, ligado ao DNE - Departamento Nacional de Educação e contanto com os funcionários do MEC que haviam feito as campanhas nacionais dos anos de 1940/1950, a orientação do recém-criado Movimento foi apoiar as iniciativas existentes (Cruzada ABC, MEB, Fundação Pe. Landell Moura), numa política de coordenação, e preparar a implantação do plano referido. Sua única atividade própria foi a produção de um programa de alfabetização a serem transmitidos pela Fundação Centro Brasileiro de Televisão Educativa, que não chegou a ser transmitido. Curiosamente, esse programa era baseado no livro-cartilha O Povo, preparado por Alfredina Paiva e Souza, cujas primeiras lições retomavam as situações de aprendizagem do livro de leitura Viver é Lutar, elaborado pelo MEB em 1963 e apreendido pela política de Carlos Lacerda, governador do estado da Guanabara, no início de 1964. No entanto, as lições posteriores desenvolvem argumentação radicalmente diferente.

A rigor experiência do MOBRAL tem início em 1970, com seu desligamento do Departamento Nacional de Educação e radical transformação de sua proposta inicial; passou a ser executor de amplo programa de alfabetização, desdobrado em vários programas complementares, com atuação em praticamente todos os municípios brasileiros. Em 1986, foi extinto e substituído pela Fundação Educar, que retomou a perspectiva de incentivo e apoio financeiro a iniciativas das secretarias de educação e de instituições privadas, definindo-se novamente como órgão de coordenação e não de execução. Realizou importante projeto de alfabetização de jovens e adultos, por meio de parcerias com entidades representativas dos movimentos populares da Baixada Fluminense (federações e associações de moradores, clubes de mães, comunidades eclesiais de base etc.), nos municípios de Duque de Caxias, Nova Iguaçu e São João de Meriti, de fevereiro de 1986 a março de 1990, período político de redemocratização do país e de fortalecimento e reconhecimento dos movimentos populares.

Nas mesmas décadas de 1970 e 1980, outro amplo programa foi desenvolvido pelo MEC: o Ensino Supletivo. A Lei n. 5692/71 dedicou-lhe um capítulo especial e sua formulação, em termos de política, foi feita pelo Parecer CNE n. 699/72, de autoria de Walnir Chagas. Ao longo dessas duas décadas, além de textos mais gerais: Diagnóstico do Ensino SupletivoEstratégia do Ensino Supletivo e documentos normativos, assim como sistemáticas relativas aos Exames Supletivos e aos Exames Supletivos Profissionalizantes, foram definidos e implantados vários projetos, entre eles: Acesso – Suplência Profissionalizante; Andrós – sistemática de módulos para ensino e material didático para cursos de qualificação profissional; Auxilia – Cursos e Exames Supletivos; Logos I e Logos II – formação de professoras leigas em exercício. Em especial, como um modelo alternativo às escolas regulares, foram criados os CES – Centros de Ensino Supletivo, alguns remanescentes até hoje, com a designação CEJA – Centros de Educação de Jovens e Adultos.

Com a retração do MEB – Movimento de Educação de Base, responsável pela programação educativa transmitida por várias emissoras católicas, e pela reserva de horários de todas as emissoras brasileiras a serem obrigatoriamente ocupados por transmissões educativas, no bojo do Ensino Supletivo foi criado o Projeto MINERVA, que teve pouca expressão nesse conjunto de ações. Por sua vez, os programas educativos a serem transmitidos pela televisão ficaram a cargo da Fundação João Batista do Amaral.

O DSU – Departamento de Ensino Supletivo do MEC foi replicado em praticamente todas as secretarias estaduais de educação, com pessoal destacado e verbas específicas para a implantação de sua estratégia e de seus projetos. Ao contrário da produção sobre o MOBRAL, é bastante farta a produção sobre o Ensino Supletivo, constante de relatórios de pesquisas, financiadas pelo próprio DESU, dissertações e teses, algumas publicadas em livros, e um estado da arte, elaborado por Sérgio Haddad e publicado pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais e pela REDUC – Rede Latino-Americana de Informação e Documentação em Educação, em 1987.

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Em meados dos anos de 1980, houve a extinção da Fundação Educar e a desativação do DESU, com a desaceleração da maioria de seus projetos. Por sua vez, o clima político da reabertura democrática, especialmente a conquista de várias administrações municipais por partidos de oposição, sobretudo pelo PT – Partido dos Trabalhadores, e a grande participação na Assembleia Nacional Constituinte, em 1987/1988, abriram novas perspectivas para a EJA. Foram retomadas e repensadas as propostas dos movimentos de cultura e educação popular do inicio dos anos de 1960, especialmente a pedagogia de Paulo Freire. Posteriormente, já nos anos de 1990, a divisão de responsabilidades entre as esferas do governo, com estímulo à municipalização, reforçou a importância das experiências feitas nos municípios, principalmente das capitais.

No período recente, três experiências são exemplares na concretização desses princípios: o PEJ - Programa de Educação Juvenil, hoje PEJA - Programa de Educação de Jovens e Adultos, no município do Rio de Janeiro; a política de EJA implantada em Porto Alegre, cuja melhor expressão é o CMET – Centro Municipal de Educação de Trabalhadores Paulo Freire; e o MOVA – Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos, organizado no município de São Paulo, durante a gestão de Luiza Erundina como prefeito e Paulo Freire como secretário de educação, posteriormente ampliado para todo o país.

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No Brasil, há importante produção sobre a educação de jovens e adultos. Entre as mais recentes, citamos: a monografia de Sérgio Haddad, Situação atual da EJA no Brasil – 2000/2005 (Patzcuáro, México: Crefal, 2008, em português e espanhol); a revista Em Aberto n. 82 - Educação de Jovens e Adultos (http://emaberto.inep.gov.br/), especialmente a seção Enfoque, preparada por Maria Margarida Machado, “A Educação de Jovens e Adultos no Brasil pós-Lei nº 9.394/96: a possibilidade de constituir-se como política pública”; o Documento Brasileiro e o Informe Nacional do Brasil, para a VI Confintea (Belém/PA, 2009); o dossiê sobre EJA organizado por Jane Paiva e Sandra Regina Sales para Arquivos Analíticos de Política Educacional.

Leia mais

O povo
Alfredina de Paiva e Souza

Situação atual da EJA no Brasil 
Sérgio Haddad

VI Confintea 
Documento preparatório nacional

VI Confintea 

Marco de ação de Belém

 

Educação de Jovens e Adultos 
Maria Margarida Machado (Org.
)

Dossiê I; Educação de Jovens e Adultos: aprendizagem no século 21

Dossiê II; Educação de Jovens e Adultos

 

 

SIREPA – Sistema Rádio Educativo da Paraíba

SIREPA – Sistema Rádio Educativo da Paraíba

O SIREPA foi criado em 1959 como um dos sistemas ligados ao SIRENA – Sistema Rádio Educativo Nacional, do então Ministério de Educação e Saúde. Foi o único sistema de escolas radiofônicas do Nordeste que não foi absorvido pelo 
MEB – Movimento de Educação de Base, após 1961, embora ambos tivessem mantido convênio, especialmente para treinamentos.

O SIREPA conviveu, no estado, com a CEPLAR – Campanha de Educação Popular, no período de 1962-1964, e, após o golpe militar, foi progressivamente substituído pela Cruzada ABC – Ação Básica Cristã, como uma das manifestações do deslocamento político-ideológico do governo estadual, e extinto em 1969.

Iniciou suas atividades retransmitindo as emissões radiofônicas preparadas pelo SIRENA e utilizando a Radiocartilha para os alunos. Em 1966, no intervalo entre o desmonte da CEPLAR e a ascensão da Cruzada ABC, teve o seu melhor desempenho, com cerca de 600 escolas radiofônicas em funcionamento. Valendo-se de sua experiência e do confronto com atividades do MCP – Movimento de Cultura Popular de Recife e do MEB-Pernambuco, passou a produzir suas próprias aulas e elaborou uma cartilha para seus alunos.

Sobre o SIREPA dispõe-se apenas do relato feito por Celso Scocuglia no livro A educação de jovens e adultos: histórias e memórias da década de 60 (Cap. 1 – Alfabetização de adultos pelo rádio, p. 19-77), reproduzido neste documentário.

Leia mais

   
Cap. 1 – Alfabetização de adultos pelo rádio
Celso Scocuglia
   

 

 

Cruzada ABC – Ação Básica Cristã

Cruzada ABC – Ação Básica Cristã*

A Cruzada ABC foi criada no Recife, em 1962, por um grupo de professores do colégio evangélico Agnes Erskine. Suas primeiras ações, designadas “Promoção Agnes”, apoiadas pelo governo do estado de Pernambuco na gestão Cid Sampaio, foram dirigidas à alfabetização da população residente em bairros pobres do Recife. O sucesso dessa iniciativa e a suspensão das atividades dos movimentos e cultura e educação popular, após o golpe militar de março de 1964, motivaram a elaboração de um plano-piloto de educação de adultos, implantado em alguns bairros da mesma cidade pela Cruzada ABC, com financiamento da Aliança para o Progresso e da fundação norte-americana Agnes Erskine.

Experimentados e aprovados o material didático e a atuação dos professores voluntários, e assumindo o conceito de desenvolvimento de comunidade e a filosofia da educação defendida pela Cruzada, as ações foram expandidas imediatamente no Recife e no Grande Recife e logo após implantadas nos estados de Paraíba, Sergipe, Ceará, Alagoas, Rio de Janeiro e Guanabara, com recursos da Aliança para o Progresso e do governo brasileiro, mais doações de entidades privadas nacionais e internacionais.

O objetivo inicial da Cruzada ABC era alfabetizar inicialmente um milhão de adultos, em acordo com o MEC aumentado para dois milhões, em cinco anos. Mas logo passou a dar ênfase ao ensino primário de quatro anos, em cursos de 18 meses, ao ensino profissional e à educação sanitária. Adotou também, como objetivo complementar e garantia de frequência às aulas, a distribuição de alimentos aos alunos, professores contratados e voluntários, o que se converteu no esteio do programa de organização comunitária. Pretendia ainda implantar e orientar os sistemas estaduais de educação de adultos, responsabilizando-se pela formação dos professores e do pessoal responsável, assim como implantar os métodos e técnicas pedagógicos, o que efetivamente conseguiu no estado da Paraíba.

Ponto forte da Cruzada ABC foi a produção e a distribuição do material didático, para a alfabetização e a pós-alfabetização. Esse material era impresso por ela própria, em uma gráfica alugada no Recife, e distribuído gratuitamente aos milhares, em suas áreas de atuação. Sua orientação, no entanto, foi a mesma utilizada pela CNAA – Campanha Nacional de Educação de Adolescentes e Adultos dos anos de 1950.

A Cruzada ABC pretendia e chegou a ser cogitada pelo MEC como única campanha de alfabetização brasileira na segunda metade dos anos de 1960. No entanto, dificuldades de obtenção de recursos financeiros para sua manutenção, cada vez mais elevados, críticas à improbidade no uso dos recursos, aliadas a críticas radicais sobre sua programação, sua orientação estrangeira, sua concepção do analfabeto como incapaz, e também a implantação do MOBRAL, em 1970, provocaram sua progressiva extinção nos estados em que atuava.¹

* Redigido com base em Vanilda Paiva, Educação popular e educação de adultos; contribuição à história da educação brasileira (São Paulo: Loyola, 1973, p. 268-282) ou História da educação popular no Brasil (São Paulo: Loyola, 6. ed. revista e ampliada, p.296-310).

¹ Além do livro de Vanilda Paiva citado, dispõe-se também do livro Contexto sociopolítico e educação popular: o caso da Cruzada ABC, de Emília Maria da Trindade Prestes e Vicente de Paulo Carvalho Madeira (João Pessoa: Ed. Universitária, 2001) e A educação de jovens e adultos: histórias e memórias da década de 60, de Afonso Celso Scocuglia (Campinas: Autores Associados e Brasília: Plano, 2003), neste último especialmente Cap. II – A Cruzada ABC contra o Sistema Paulo Freire e a esquerda no pós-golpe de 1964 (p. 79-160), reproduzidos neste documentário.

Projeto João de Barro

Projeto João de Barro

Em 1965 foi eleito José Sarney, candidato da oposição, como governador do estado do Maranhão. Para romper a estrutura de estagnação mantida durante décadas pelos governos anteriores, o governo José Sarney prometia implantar no estado nova ordem econômica e social, sob o slogan de “Maranhão Novo”, com vista a integrá-lo no “progresso” que atingira o país a partir da década de 1950, especialmente no Centro-Sul.

Para a consecução desse plano, a educação ocupava um lugar de destaque. Entre as várias medidas nessa área, sobressaem: 1) o Projeto Televisão Educativa, que visava a ampliar a oferta do antigo curso ginasial, em São Luís e nos municípios próximos, com salas de aula pioneiramente equipadas, transmissão de conteúdos previamente elaborados e assistência de professores treinados; 2) o Projeto Bandeirante, para a mesma ampliação em municípios do interior, sem aceso à televisão; e 3) o Projeto João de Barro, ofertando a alfabetização e o antigo ensino primário para a população rural, com a intenção de prepará-la para o pretendido desenvolvimento.

Embora já na ditadura militar, esses projetos se valeram de experiências realizadas nos anos anteriores. Os dois primeiros partiram da experiência de um ginásio montado na perspectiva da “escola nova moderna”, realizada em Colinas, no próprio Maranhão, e das propostas de “ginásio orientado para o trabalho”, divulgadas pelo MEC. No caso do Projeto João de Barro, na medida em que o estado não teria recursos para construir escolas tradicionais, retomou-se a proposta da Campanha “De Pé no Chão também se Aprende a Ler”: as escolas, “barracões” de madeira, cobertos de palha, deveriam ser construídas pela própria “comunidade”¹ e o mobiliário montado por carpinteiros, com madeira extraída das matas e pagos pelo estado. Da experiência do MEB – inclusive pela participação de vários ex-integrantes do mesmo na equipe de coordenação, no período inicial (1968-1970) –, foram retomadas, as práticas de estudo de área, reunião com a população para a escolha do local da escola e do futuro monitor, e dos treinamentos. Do Sistema de Alfabetização Paulo Freire, simplificado, a inspiração para a primeira cartilha – que na verdade reproduz algumas produções dos movimentos de cultura de educação popular do início dos anos de 1960, mesmo assim empobrecidos, pelo controle ideológico e policial vigente no período.²

O Projeto João de Barro enfrentou duas contradições fundamentais. Por um lado, sendo uma proposta do Estado, não conseguiu ser uma escola do povo; aos poucos transformou-se em uma escola para o povo. Por exemplo: como os contatos iniciais eram feitos com os prefeitos e com os proprietários ou seus prepostos, a participação popular desejada reduziu-se, após a primeira fase, à distribuição de tarefas: construção do “barracão” e montagem do mobiliário. Às vezes, o monitor escolhido pela “comunidade” não era aceito e substituído pelo prefeito. Era natural, então, que a população reagisse à escola, ou passasse a vê-la útil apenas para seus filhos.

Por outro lado, o projeto de desenvolvimento econômico-social configurou-se rapidamente em uma modernização da produção do campo: grandes extensões de terras devolutas, de propriedade do Estado, foram vendidas a conglomerados financeiros do Centro-Sul, ao mesmo tempo em que se acentuava a grilagem de terras de posseiros, para a criação de gado. Radicalizou-se a violência no campo, acobertada pelas forças policiais e militares; pela força do sistema ditatorial, os sindicatos, antes ativos, haviam se transformado em entidades de assistência. Em consequência, depois de formados os pastos, poucos camponeses passavam a trabalhar como assalariados; muitos migravam de um povoado para outro, em busca da terra cada vez mais escassa, ou para as cidades, empregando-se, por exemplo, na construção civil.

Ao longo dos seus sete anos de existência (1967-1974), quando foi substituído pelo Mobral e pelo Projeto Minerva, o Projeto João de Barro mostrou, primeiro, a inviabilidade da escola, montada conforme as estruturas da máquina burocrática da esfera pública e cimentada pelo poder político hegemônico, confrontar-se com o projeto maior de transformação da sociedade. Em segundo, a impossibilidade de um governo, mesmo pretensamente democrático, efetivamente desenvolver uma educação popular.

Foram produzidas duas dissertações de mestrado sobre o Projeto João de Barro, ambas no Instituto de Estudos Avançados em Educação da Fundação Getúlio Vargas/RJ , aprovadas respectivamente em 1982 e 1985: Arno Kreutz - O Projeto João de Barro; uma experiência oficial de educação popular no Maranhão; e Claudett de Jesus Ribeiro – História de uma escola para o povo; Projeto João de Barro, Maranhão 1968-1974. Ambas estão reproduzidas neste módulo, assim como a cartilha “João de Barro”³.

¹ A designação “comunidade” para o Maranhão, e de resto para praticamente todo o país, é imprópria. A população rural vivia em “povoados”, sem nenhuma estrutura física, e, no caso em questão, por posseiros, os quais, por não terem a propriedade da terra, nem sempre mantinham laços de convivência duradouros; mudavam-se com relativa frequência, principalmente após a implantação das empresas agropecuárias.

² Por exemplo, comparar a cartilha “João de Barro” com Uma família operária – manual de alfabetização para adultos e adolescentes, do CPC de Belo Horizonte, 1962, e Mutirão – 1º livro de leitura, MEB, 1965.

³ No livro de Arno Kreustz ver em particular o anexo: Projeto João de Barro (cópia do original), p.113-124.

 

Didático

Didático

Cartilha João de Barro

 

Alfabetização Funcional

Alfabetização Funcional

Na segunda metade dos anos de 1960, a UNESCO passou a rever a ação extensiva das campanhas de alfabetização e educação de base, cujos resultados na maioria dos países não se mostraram significativos quanto à diminuição do analfabetismo. Em consequência redefiniu o conceito de alfabetização, passando a designá-la como alfabetização funcional. Seu conteúdo foi explicitado por Luis Eduardo Soria, técnico da UNESCO trabalhando no CREFAL – Centro de Educación para el Desarollo de la Comunidad em América Latina:

A alfabetização funcional, como a concebe atualmente a Unesco, constitui um processo global e integrado de formação profissional e técnica do adulto – em sua fase inicial – realizada em função da vida e das necessidades do trabalho; um processo educativo diversificado que tem por objeto converter os alfabetizados em elementos conscientes, ativos e eficazes na produção e no desenvolvimento em geral. Do ponto de vista econômico, a alfabetização funcional pretende a dar aos adultos iletrados os recursos apropriados para trabalhar, produzir e consumir mais e melhor. Do ponto de vista social, visa a facilitar sua passagem de uma cultura oral a uma cultura escrita, a contribuir para o melhoramento pessoal e grupal, assim como, mediante sua ativa participação, conseguir um maior grau de integração social e o progresso do país em que vivem. A alfabetização funcional compreende, pois, uma formação múltipla: cultural, econômica social e política. (SORIA, 1968, p. 59-60, tradução livre).

Ainda conforme Soria, suas características principais seriam:

a) base seletiva – os programas devem localizar-se, em primeiro lugar, em áreas onde estavam sendo realizados ou por serem realizados projetos de melhoria econômica e social, nos quais os adultos a serem alfabetizados estariam potencialmente incorporados à produção agrícola e industrial e, por essa razão, suas motivações com respeito à alfabetização poderiam ser facilmente estimuladas e sua aprendizagem imediatamente utilizada. Isso exigiria uma seleção cuidadosa das áreas e dos grupos de população com os quais se pretende trabalhar: programas de reforma agrária e colonização, tecnificação agrícola, cooperativismo e industrialização em geral. E importaria mais alfabetizar as pessoas que estivessem em idade produtiva, das quais é possível esperar uma contribuição significativa para o desenvolvimento econômico e social.

b) concentração de esforços – a seleção de setores ou de lugares nos quais estivessem sendo concentrados os recursos disponíveis permitiria realizar um ação mais vigorosa e eficiente.

c) relação com as prioridades do desenvolvimento – exigindo cuidadoso estudo da realidade e conhecimento das metas do plano de desenvolvimento, de forma a conhecer-se as necessidades de mão de obra qualificada e adequar a programação educativa para atender a sua formação. (SORIA, 1968, p. 62-65, tradução livre).

Soria compara a alfabetização funcional com a alfabetização tradicional, apontando como diferenças fundamentais:

a) seus conteúdos não teriam caráter escolar, mas relação direta com as necessidades de formação profissional do analfabeto adulto;

b) deveria dispor de métodos diferenciados, conforme os diversos grupos de pessoas e os objetivos específicos de sua formação;

c) exigiria o trabalho conjunto de uma equipe interdisciplinar, cuja ação deveria estar integrada em todos seus aspectos e fases;

c) sua avaliação seria um processo contínuo e amplo, tanto quantitativo como qualitativo, precedendo mesmo o início do projeto;

d) deveria ser considerada um investimento que resultasse em utilidade econômica. (SORIA, 1968, p. 67-68, tradução livre).

O Brasil não estava entre os países da América Latina inicialmente selecionados para a implantação de projetos experimentais. No entanto, contatos visando à assessoria da UNESCO em experiências de educação de adultos tiveram início com solicitação da SUDENE – Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, em 1967, não levada a cabo. Segundo Vanilda Paiva, em 1968, logo após a criação do MOBRAL, a UNESCO propôs um projeto experimental de cinco anos, a ser iniciado em 1969. Não se tratava de um programa de educação de massa, como o MOBRAL passou a implantar a partir de 1970, mas “de micro-experiências em meio urbano e rural, abrangendo entre 300 e 1.000 pessoas, a fim estudar os custos de alfabetização por indivíduo e de buscar métodos de alfabetização verdadeiramente funcionais” (PAIVA, 2003, p. 489).

Após entendimentos, foram definidos três projetos, a serem realizados no período 1968-1971 e, para assessorar sua realização, a UNESCO colocou à disposição do governo brasileiro um técnico em alfabetização funcional, pelo período de um ano:

a) na Cia. Vale do Rio Doce, em Vitória, alfabetização funcional e aperfeiçoamento de mão de obra industrial;

b) no Nordeste brasileiro, alfabetização funcional em bases cooperativas, realizado entre 1968 e 1970, em municípios da Região Agreste do Estado de Pernambuco, pela ANCARPE – Associação Nacional de Crédito e Assistência Rural de Pernambuco);

c) em projetos de assentamento da reforma agrária do INCRA – Instituto Brasileiro de Colonização e Reforma Agrária, no Nordeste e no atual estado de Mato Grosso do Sul.

Experiência na Cia. Vale do Rio Doce

A experiência de alfabetização funcional e aperfeiçoamento de mão de obra industrial, realizada na Cia. Vale do Rio Doce, em Vitória, foi coordenada diretamente pelo assessor da UNESCO. Teve a duração de seis meses para uma primeira turma de 60 operários, em 1968, e foi repetida para uma segunda turma de nove operários, com duração de três meses, em 1969. Segundo Paiva:

Os trabalhadores que participaram da experiência foram escolhidos depois de uma consulta à empresa e da identificação dos pontos de estrangulamento no funcionamento da mesma. Tratava-se de identificar os grupos de trabalho que apresentassem maior frequência de comportamento disfuncional à produção.

[...] O ensino, ministrado no local e durante o horário de trabalho e remunerado como tal, era ministrado em aulas individuais pelo chefe de equipe ou por um operário alfabetizado sob a supervisão de um monitor qualificado.

O método utilizado substituía fichas ou manuais por um trabalho estatístico realizado em computador para determinar o valor da frequência das sílabas (pesquisadas nos métodos anteriormente empregados no país e através de entrevistas para chegar a um vocabulário válido e compreensível pelos trabalhadores, por categoria profissional e área geográfica) e pretendia ensiná-los segundo esta ordem. (PAIVA, 2003, p. 491-492)

Apesar dos bons resultados obtidos e da manifestação da empresa a favor de sua extensão para 10 mil operários, a experiência não foi levada adiante. Também a proposta didática jamais foi repetida. Por sua vez, embora Vanilda Paiva considere apenas esta experiência como alfabetização funcional no período, as experiências realizadas sob a coordenação da ANCARPE e do INCRA, a seguir relatadas, também foram nomeadas como tal e representaram, de certa forma, uma retomada dos trabalhos do início dos anos de 1960, sob outra perspectiva.

Essa mudança de perspectiva já se manifestara no I Seminário de Educação e Desenvolvimento, promovido pela SUDENE, no Recife, em 1967. O documento resultante desse seminário colocava a educação de adultos nos seguintes termos:

Considerada a Educação de Adultos como um processo contínuo e integrado no desenvolvimento, é necessário que tenha como características:

1. A conscientização da população, de modo a permitir uma participação responsável e produtiva mediante: a) interpretação dinâmica dos novos valores e hábitos, bem como a reintegração dos valores tradicionais referentes à vida pessoal e coletiva; b) estímulo à participação na vida política do país.

2. A capacitação para assumir as novas formas concretas de trabalho, bem como situações mais complexas de organizações coletivas. (SUDENE, 1967, p. 14)

No que diz respeito à alfabetização, alertava:

A alfabetização poderá ser um dos pontos de partida para a Educação de Adultos, mas apenas como uma etapa instrumental, Não se deve limitar à aprendizagem da leitura e da escrita como fins em si mesmos, porém como “alfabetização funcional”, enquanto instrumentaliza o homem e o faz usuário de um bem fundamental da época moderna em que as comunicações tendem a se fazerem através da linguagem escrita, particularmente nas áreas urbanas.

Sendo o processo educativo algo dinâmico e integralizador, não se pode pensar numa Educação de Adultos em termos de escolaridade, mas em termos da dinamização das comunidades e integração de todas as atividades com abertura para as mudanças necessárias a um país em desenvolvimento. (SUDENE, 1967, p. 10-11)

Alfabetização funcional em bases cooperativas em Pernambuco

Embora os contatos iniciais para a implantação de um projeto de alfabetização funcional no meio rural tivessem sido feitos com o INCRA, por motivos políticos a escolha recaiu sobre a ANCARPE, que elaborou o Projeto de alfabetização funcional em bases cooperativas para seis municípios da microrregião do Agreste de Pernambuco: Canhotinho, São João, Jurema, Angelim, Calçado e Lajedo. Em todos eles já havia ações extensionistas e várias pequenas cooperativas em funcionamento e o trabalho seria financiado pela SUDENE e articulado com várias outras instituições. Por acordo posterior, o projeto foi estendido para os municípios de Cumaru, em associação com o Departamento de Assistência ao Cooperativismo da Secretaria de Agricultura do Estado de Pernambuco, e ao município de São Joaquim do Monte, por interesse da prefeitura, e apoio da diocese católica local e da LBA – Legião Brasileira de Assistência.

A região do agreste pernambucano é marcadamente minifundiária (propriedades familiares de 10 ha., em média), desenvolvendo a agropecuária, sobretudo bovina, e o cultivo de milho, algodão, feijão, mandioca, banana, laranja e produtos hortigranjeiros. Considerava-se o nível tecnológico muito baixo; por exemplo, apenas uma minoria dos agricultores preparava a terra para plantio usando tração animal e não havia nenhum controle racional de custos e rendimento da produção. O atendimento escolar às crianças reduzia-se a um número insuficiente de escolas, funcionando com classes multisseriadas e atendendo apenas ao início da alfabetização.

Nos seis municípios polarizados por Lajedo, com uma população rural em torno de 80 mil pessoas, à qual somavam outras quase 10 mil reunidas em “grupos de vizinhança”, iniciou-se o trabalho com a discussão de vários números do Jornal do Trabalhador, enviado a 22 comunidades rurais desses municípios, para ser lido e discutido em grupos. Essa ação possibilitou estimar o índice de analfabetismo em 80%. Em consequência, planejou-se criar 200 classes de alfabetização para adolescentes e adultos, com no máximo 30 alunos cada, agrupados de 15 a 21 anos e de 22 anos e mais. Isso significaria atender um total de 6 mil pessoas, no período inicial. Na verdade, foram instaladas apenas 90 classes, com 2.053 matriculados e 1.402 concluintes.

O método escolhido para a alfabetização, embora não declarado, baseou-se no Sistema de Alfabetização de Adultos proposto por Paulo Freire, sem a fase inicial de discussão das “fichas de cultura”; colocava os participantes dos “círculos de debate” em uma atitude extremamente ativa para a alfabetização. Da mesma forma, certamente não pode ser assumido o caráter expressamente político do referido Sistema. No entanto, as palavras geradoras e as situações de aprendizagem, escolhidas a partir do levantamento do universo vocabular da população visada, deram margem à construção de material didático adequado, embora mais pobre do que o produzido pelos movimentos de cultura e educação popular (o que se justificava pelo momento extremamente autoritário), mas ainda inovador se comparado ao utilizado pelas campanhas nacionais dos anos de 1940/1950, recriado nos anos de 1960 pela Cruzada ABC e também pelo MOBRAL, pelo menos nos seus primeiros anos.

O relatório final da experiência afirma que o diálogo nos diferentes grupos atendeu a um dos objetivos propostos no projeto: criar a “consciência crítica de sua situação existencial”, mas a alfabetização funcional ressentiu-se da não existência de um projeto maior de desenvolvimento econômico-social da região. Assumindo que essa primeira fase tinha como objetivo central a criação de atitudes de cooperação, o relatório registra: “Acreditamos que, em vista da ausência de um trabalho em nível das estruturas cooperativas, foi positiva a pouca agressividade de capacitação dos alunos em classe, nesse campo; do contrário, teríamos um grupo com aspiração alta, acima de uma realidade do momento.” (ANCARPE, 1970, p. 86).

A avaliação da experiência mostrou também a dificuldade relativa ao ensino inicial da matemática (a rigor, da aritmética) para adultos que dominavam processos de cálculo mentais, mas não conheciam nem mesmo os algarismos. Experiência anterior do MEB, praticamente na mesma área, já havia enfrentado essa dificuldade, mas tentava superá-la com base na motivação de problemas concretos derivados de situação vivenciais da população, o que foi ignorado pelo Projeto. Na verdade, muitas das experiências anteriores foram “sufocadas” pelo regime militar e permanecem ignoradas até hoje.

O projeto da ANCARPE supunha um desdobramento em termos de pós-alfabetização e intensificação das ações cooperativas. Exemplo desse objetivo é a edição de vários números do Jornal do Agricultor. Mas o momento político, que não suportava a mínima tentativa de “conscientização”, provocou seu encerramento com um Seminário de Avaliação realizado em outubro de 1970.

Alfabetização funcional em projetos de reforma agrária

Apesar de não apoiado pela UNESCO, por intermédio de suas equipes técnicas responsáveis pelas ações sociais e educativas, o INCRA realizou experiências de alfabetização funcional em projetos de assentamento de agricultores, no Nordeste: Caxangá e Quatis, no estado de Pernambuco, e Rio Tinto, no estado da Paraíba.

Caxangá resultara da desapropriação de um grande conjunto de engenhos de cana, na zona da mata de Pernambuco, compreendendo inclusive uma velha usina de produção de açúcar. A ação do INCRA visava a manter a produção agrícola e industrial, organizando os trabalhadores para isto. Um convênio de um ano com o MEB havia alfabetizado 1.027 pessoas, mas um segundo levantamento, após a anexação de novos engenhos, indicou a existência de outros 2.727 analfabetos. Foi prevista a instalação de 50 classes, assumidas diretamente pelo INCRA, para atender, em uma primeira etapa, 1.250 alunos. Nessas classes seria desenvolvido também um programa de pós-alfabetização para os recentemente alfabetizados.

Quatis era um núcleo-modelo, na zona do agreste do mesmo estado, no qual estavam assentadas cerca de 300 famílias. Entre os moradores havia 489 analfabetos, prevendo-se a instalação de 30 classes. Por sua vez, em Rio Tinto, na Paraíba, cujo projeto resultara da desapropriação de uma grande unidade agrícola, moravam e trabalhavam 4.215 famílias. As ações desenvolvidas na área mostravam melhoria significativa na agricultura de sobrevivência e a agricultura de mercado, a partir de 1968, começou a ser financiada pela rede bancária local. As exigências de assinatura de contrato e a comercialização dos produtos em escala maior, indicavam a necessidade da alfabetização, aspiração sobretudo dos chefes de família.

Da mesma forma que o projeto desenvolvido pela ANCARPE, para a alfabetização, adotou-se nesses projetos o Sistema de Alfabetização de Adultos de Paulo Freire, com as mesmas limitações: abandono da discussão das “fichas de cultura” (embora em Rio Tinto as primeiras discussões abordassem o conceito de cultura) e da perspectiva explicitamente política. Tendo como ponto de partida o levantamento do “universo vocabular”, com a consequente seleção de palavras-chave e situações de aprendizagem, o material didático produzido (Aprender para viver, em Rio Tinto), inclusive para leitura dos recém-alfabetizados (Construir com todos, em Quatis), resultou bastante interessante. E tendo sido mantido o debate como postura pedagógica fundamental, foi garantido o caráter instrumental da alfabetização e trabalhada a organização social do projeto, ao lado da pretendida reestruturação e tecnificação da produção agrícola.

Essas ações estavam inseridas em uma nova metodologia para os projetos de reforma agrária ou de colonização, que rompia com posturas extremamente tecnicistas e autoritárias de uma fase anterior de elaboração e implantação desses projetos. Passou-se, então, partir da experiência anterior dos assentados, respeitando no que fosse possível seus saberes e suas práticas, mas procurando atualizá-las por meio da seleção dos cultivos a serem feitos e com a melhoria das sementes e do plantio, assim como do controle da comercialização, por meio de uma cooperativa. Essa metodologia foi sistematizada no Projeto Iguatemi, situado no atual estado do Mato Grosso do Sul, no qual foram assentadas 1.500 famílias, e passou a ser utilizada, no que cabia, em outros projetos de reforma agrária ou de colonização. Chegou mesmo a ser recomendada para outros países da América Latina, pelo IICA – Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (cf. FAVERO, 1973).

Embora em Iguatemi tenha sido feita uma pesquisa preliminar sobre a alfabetização dos parceleiros (cf. FAVERO, 1972) e tendo sido aplicados testes preliminares, a situação política impediu a aplicação da metodologia de alfabetização funcional. O endurecimento do regime militar, alimentado pelas reações dos donos de terra que se sentiam prejudicados pelas relativamente tímidas ações de reforma agrária, e a opção governamental de abertura de novas frentes de ocupação na Amazônia legal, ignorando a nova metodologia de estruturação e organização de projetos de assentamento, provocou o desmonte das equipes que trabalhavam a dimensão social desses projetos.

Características comuns a essas experiências

Todas as experiências descritas tiveram projetos técnicos previamente elaborados, alguns deles tomando por base os resultados de pesquisas socioeconômicas realizadas nas áreas a serem trabalhadas. Esses projetos continham, sistematicamente: caracterização da área, dados de levantamento da situação quanto à alfabetização, programa a ser desenvolvido, compreendendo medidas de implantação, assim como o processo de supervisão e avaliação, cronograma de execução, abrangendo no máximo dois anos, e previsão de custos.

Os objetivos propostos para a alfabetização funcional eram em geral: a) elevação do nível de instrução com a aprendizagem da leitura, escrita e cálculo; b) introdução de novas técnicas e transmissão de conhecimentos para aumento da produção e da produtividade; c) incentivo ao espírito associativista e cooperativista; d) desenvolvimento da capacidade empresarial para assumirem a cooperativa, visando sua rápida autonomia (no caso do INCRA); fornecimento de noções sobre os problemas básicos e instrumentalização para superar os problemas imediatos.

A ANCARPE sintetizava da seguinte forma o objetivo geral do método de alfabetização:

Tal método visa a garantir uma permanente motivação – estar sempre dentro da vida das pessoas do grupo trabalhado; uma ampliação do “aqui e agora” para o “ali, ontem-e-amanhã”, numa atitude incessantemente crítica; uma imprescindível funcionalidade dos novos conhecimentos; um clima mais favorável à mudança de hábitos e costumes e uma maior firmeza nas decisões assumidas em grupo. (ANCARPE, 1970, p. 23)

Tinham ainda praticamente os mesmos critérios de seleção dos monitores que se encarregariam das classes de alfabetização, escolhidos entre os que tinham pelo menos o 2º ano primário e liderança em seu vilarejo. Eram preparados em cursos de treinamento relativamente longos (30 dias no caso da ANCARPE) e seu desempenho era acompanhado e apoiado pela supervisão regular.

A equipe técnica encarregada da coordenação era muldisciplinar, composta por professoras e agrônomos (no caso da ANCARPE, extensionistas rurais).

Como foi dito, o sistema de alfabetização utilizado resultou de uma adaptação da experiência de Paulo Freire em Angicos, adaptação essa forçada pelo contexto político extremamente autoritário. Mesmo assim, a realização dos objetivos propostos, mesmo que não radicais, foi suficiente para estancar todas as experiências.

Na impossibilidade de usar projetores, como havia sido utilizado no Sistema Paulo Freire, passou-se a utilizar álbuns seriados, apresentando as gravuras e as palavras geradoras, sua decomposição e pequenas frases para leitura e escrita. Para os alunos, eram distribuídos cadernos e cartilhas. Apesar de serem elaborados por equipes diferentes, nota-se grande semelhança no material preparado para a alfabetização.

As classes funcionavam em escolas ou locais adaptados, cada projeto fornecendo o quadro negro e o lampião, assim como recursos para a montagem de mesas para os professores e bancas simples para os alunos. Essa situação mostrou-se precária, chegando a ser apontada como uma das limitações para a aprendizagem. Por sua vez, a reposição dos bujões a gás e dos cadernos, a cargo da “comunidade”, também gerou problemas.

Em termos de apreciação geral, no âmbito dos projetos maiores de extensão rural e de reforma agrária em que foram realizadas, e o contexto político-autoritário referido, as experiências de alfabetização funcional foram válidas como experiências. O cuidadoso planejamento, o acompanhamento sistemático e, sobretudo, a avaliação rigorosa permitiriam sua ampliação, atendendo pelo menos em parte às diretrizes da UNESCO, devidamente criticadas e adequadas à realidade brasileira. Não foi isto, no entanto, que ocorreu: a partir dos anos de 1970 iniciou-se a montagem do MOBRAL, um programa de massa que atingiu todo o país e que, embora passasse a usar a designação de alfabetização funcional, retomou, para adolescentes jovens e adultos, práticas tradicionais da alfabetização, em boa parte seguindo os mesmos padrões da alfabetização para crianças.

Referências bibliográficas

ANCARPE – Serviço de Extensão Rural de Pernambuco. Documento final do Seminário de Avaliação da Experiência de Alfabetização Funcional em Bases Cooperativas em Pernambuco. Recife: Ancarpe, 1970.
FÁVERO, Maria de Lourdes de Albuquerque. Alfabetização de adultos e sua posição em um projeto de desenvolvimento integrado. Dissertação (Mestrado em Educação). Rio de Janeiro: Pontifícia Universidade Católica, 1972.
FAVERO, Osmar. Educação de adultos em projetos integrados de reforma agrária. Dissertação (Mestrado em Educação). Rio de Janeiro: Pontifícia Universidade Católica, 1973.
FIELD, E. Project experimental d’alphabetization fonccionelle de la Cia. Vale do Rio Doce au Brèsil. UNESCO, 1969.
PAIVA, Vanilda. História da educação popular no Brasil; educação popular e educação de adultos. 9 ed. São Paulo: Loyola, 2003.
SORIA, Luis Eduardo. Alfabetización funcional de adultos. Pátzcuaro, Michoacán, México: CREFAL, 1968.
SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste. Diretrizes para os programas de educação de adultos. Documento final do I Seminário de Educação e Desenvolvimento – Educação de Adultos – jan. 1967. Recife: Divisão de Documentação, 1967.

Leia mais
   
Diretrizes para os programas de Educação de Adultos   Nota de Vanilda Paiva  

 

Vale do Rio Doce

Vale do Rio Doce

Projeto experimental Cia. Vale do Rio Doce

 

MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização

MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização

1. Breve histórico

O MOBRAL foi criado em dezembro de 1967, mas efetivamente organizado em 1970, com uma radical reformulação do projeto inicial. Suas primeiras ações foram: montagem da equipe diretora central; formação das comissões estaduais e municipais, com as quais foram assinados os primeiros convênios; e definição do PAF – Programa de Alfabetização Funcional, cuja meta era eliminar o analfabetismo das pessoas adultas, no prazo de dez anos.

O PAF – Programa de Alfabetização Funcional foi prioritário durante toda a década de 1970, complementado pelo PEI – Programa de Educação Integrada, implantado por reivindicação dos egressos do PAF que pleiteavam continuidade da escolarização nas quatro primeiras séries do atual ensino fundamental e, mais tarde, pelo Programa de Autodidatismo. Desde o início, contou também com o Programa de Atividades Culturais, transformado, na década de 1980, no PRODAC – Programa Diversificado de Ação Comunitária, que passou a ser o programa mais importante do MOBRAL, com várias ações culturais e produção de material diversificado, até sua extinção em 1986.

Apesar de sua abrangência nacional (vangloriava-se de atingir todos os municípios do país) e da situação privilegiada de recursos (certamente o movimento mais bem-aquinhoado, no caso brasileiro), de seu forte desempenho e da abundância do material didático, assim como do numeroso e bem-estruturado quadro de funcionários técnicos e administrativos, lotados na administração central, é relativamente pequena a produção acadêmica sobre ele. Além das publicações do próprio Movimento, em geral apresentando e avaliando seus programas, dispõe-se da dissertação de José Luís Oliveira, As origens do Mobral, vários relatórios de pesquisa e dissertações elaboradas por seus técnicos sobre temas específicos.

A produção mais crítica sobre o Movimento são três artigos de autoria de Vanilda Paiva, sob o título geral Mobral, um desacerto autoritário: I – O Mobral e a legitimação da ordem; II – A falácia dos números: o programa de alfabetização funcional e III – Estratégias de sobrevivência do Mobral. Inicialmente publicados na Revista Síntese n. 23, 24 e 25, em 1982, foram incorporados na última edição de seu livro História da educação popular e da educação de adultos no Brasil (São Paulo, Loyola, 6. ed. 2004). Há também uma análise comparativa feita por Gilberta Martino Januzzi, em Confronto pedagógico: Paulo Freire e Mobral (São Paulo: Cortez e Moraes, 1979).

Em novembro de 1985, o MOBRAL foi extinto, tendo sido substituído pela Fundação Educar, que retoma a perspectiva de incentivo e apoio financeiro a iniciativas das secretarias de educação e de instituições privadas e novamente definido como órgão de coordenação e não de execução. A Fundação Educar realizou importante projeto de alfabetização de jovens e adultos, por meio de parcerias com entidades representativas dos movimentos populares (federações e associações de moradores, clubes de mães, comunidades eclesiais de base etc.) na Baixada Fluminense, atuando nos municípios de Duque de Caxias, Nova Iguaçu e São João de Meriti, de fevereiro de 1986 a março de 1990, período político de redemocratização do país e de fortalecimento e reconhecimento dos movimentos populares.

2. Principais programas¹

2.1 PAF – Programa de Alfabetização Funcional (prioritário em 1970/ 1980)

O MOBRAL entendia a alfabetização como meio para propiciar a adolescentes e adultos a aplicação prática e imediata das técnicas de ler, escrever e contar, permitindo-lhes buscar melhores condições de vida. Teria a duração de cinco meses e esperava-se que criasse possibilidade para a semiqualificação profissional que, nessa fase, seria voltada para o aproveitamento e o desenvolvimento de habilidades que influem no sustento da família.

Aplicava o sistema de palavras geradoras e era colocado à disposição dos alunos todo o material didático, básico e complementar. O material básico seria composto de: Manual do Alfabetizador, Livros de leitura e de exercícios de Linguagem e de Matemática, além de cartazes e cartões com palavras geradoras, palavras-exemplo, frases contexto e textos. Por sua vez, o material complementar seria composto de livros, jornais, folhetos e jogos.

Durante o período considerado prioritário, o material didático básico era produzido sobretudo por grandes editoras comerciais (Abril e Bloch), a partir de editais propostos pelo MOBRAL e acompanhamento feito pelas suas equipes técnicas.Os livros eram impressos em grandes quantidades, para serem distribuídos aos professores e alunos de todo o país. A partir dos anos de 1980, o MOBRAL passou a produzir seus próprios materiais, observando-se mais qualidade e melhor adequação à educação dos adultos.

De acordo com a publicação O PAF e sua diversificação (Geped, 1981), teriam existido os seguintes projetos: Recuperação de alunos, ao longo do processo; Programa de Alfabetização Funcional via Rádio; Programa de Alfabetização Funcional via Televisão; Programa de Alfabetização Funcional e Educação para o Trabalho e Programa de Educação Comunitária para a Saúde. Várias publicações demonstram esta diversificação.

2.2 PEI – Programa de Educação Integrada

Destinava-se a oferecer aos adultos e adolescentes alfabetizados pelo MOBRAL ou à clientela que não havia concluído a escolaridade na idade adequada as primeiras quatro séries do Ensino Fundamental, orientação para o trabalho.

A duração dos cursos seria de 720 horas e o método adotado seria a integração das áreas de conhecimento pela exploração de textos geradores. O MOBRAL distribuiria o seguinte material didático básico: Manual do professor, Livros de texto, Exercícios de Matemática, Ciências, Estudos Sociais, Comunicação e Expressão, além de glossário e cartazes para exploração de textos geradores.

O PEI teve também a versão do Programa de Autodidatismo, criado como outra forma de atender aos interessados e com o propósito de incentivar a gradual autonomia dos educandos, inclusive preparando-os para os exames supletivos. Dispunha de material específico, distribuído nos postos, onde também se disponibilizava orientação para os estudos.

Esses programas eram coordenados pela Gerência Pedagógica (Geped), na qual trabalhavam Adélia Maria Nehme Simão e Koff, Maria Peregrino e Jane Paiva.

2.3 Programa de Profissionalização

Complementar ao PAF e ao PEI, o Programa de Profissionalização visava a criar condições de melhoria no campo profissional, oferecendo à clientela condições de integração no mercado de trabalho.

Era composto dos seguintes subprogramas: 1. Testagem e Orientação Profissional, desdobrado nos projetos de Orientação Profissional e Informação Profissional; 2. Treinamento Profissional, desdobrado no Projeto Especial de Semiqualificação e no Projeto de Capacitação; 3. Colocação, realizado por meio do Balcão de Empregos.

Assumiria a sistemática adotada pelo PIPMO – Programa Intensivo de Preparação de Mão de Obra, do então Ministério do Trabalho, e seria executado por meio de convênios com este programa, com o SENAI e o SENAC e outras agências. Nele foram produzidos estudos sobre “famílias ocupacionais”.

2.4 Programa de Atividades Culturais

Também com caráter complementar aos programas anteriores, visava a contribuir, de maneira informal, flexível e dinâmica, para a ampliação do universo cultural dos alunos e da comunidade a que pertenciam. Não eram feitos em salas de aula, de modo que, ultrapassando-as, se tornassem um processo para toda a vida, na perspectiva da educação permanente. Para sua execução, instalaram-se postos culturais fixos, em geral na sede de municípios, e criaram-se unidades móveis, as Mobraltecas: kombis ou barcos, com livros, filmes e discos e quadros de pintores famosos, e equipadas com palco para apresentações artísticas das comunidades. A passagem de uma Mobralteca por uma comunidade previamente escolhida era antecipada por uma ação preparatória, realizada por uma equipe de animadores do programa.

Compreendia os seguintes subprogramas: Literatura, Cinema, Teatro, Arte Popular e Folclore, Música, Rádio, Televisão, Publicações, Artes Plásticas, Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural, e Reservas Naturais.

Além do acervo reunido nas Mobraltecas, foram produzidas nesse programa publicações sobre ervas medicinais, receitas caseiras, livros para neoleitores alfabetizados, livros resultantes de concursos (poesias e literatura em geral). Supõe-se que também a série “Cada cabeça é um mundo” pertencente ao programa Tecnologia da Escassez, estava nele compreendida.

2.5 Programa Infanto-Juvenil

Os alunos adolescentes frequentavam os programas do MOBRAL e consta sua matrícula ter passado a ser bastante significativa, no final dos anos de 1970 e início de 1980. Este fato teria motivado a elaboração, em 1984, de diretrizes específicas para atender adolescentes na faixa etária de 9 a 14 anos fora da escola, cuja implementação deveria ser feita de forma articulada com a Secretaria de Ensino de 1º e 2º Graus do MEC.

2.6 Programa de Ação Comunitária (prioritário a partir de 1980)

Entendido como continuidade do processo educativo implantado nos municípios, teria como objetivo oferecer mais oportunidades de capacitação para participar do processo de promoção e integração social iniciado nos outros programas. Foi concebido inicialmente como um curso de dois meses, com duas horas diárias, a ser desenvolvido a partir dos interesses dos participantes, utilizando técnicas de trabalho em grupo.

Material didático distribuído: Você é importante (livro do aluno), Você é ação (livro do monitor), Você é líder (livro para a Comissão Municipal).

Foi um programa muito questionado, sob o argumento que seria uma “contrapartida” às Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica, muito fortes no período, e também por associar-se ao projeto de ação comunitária das Forças Armadas.

2.7 Programa Pré-Escolar²

Implantado quando Teresinha Saraiva assumiu a secretaria executiva, na gestão de Cláudio Moreira como presidente. Era coordenado por Aristeo Leite Filho e nele trabalharam, entre outros, Sonia Kramer, Solange Jobim e Souza e Fernanda Nunes. Foi assumido posteriormente pelo MEC, que deu continuidade também às publicações: série Temas para Reflexão e revista Criança: Informativo ao monitor.

2.8 PES – Programa de Educação Comunitária para a Saúde

Sua definição não foi encontrada, apenas um artigo de Gerson Noronha Filho, Diretor do Programa de Projetos Especiais. Podem ser nele incluídos os folhetos sobre métodos contraceptivos, vacinas, planejamento familiar, horta comunitária etc.

2.9 Programas de Gestão, Supervisão e Avaliação

Além dos programas-fim, o MOBRAL mantinha ainda programas-meio, específicos de gestão, supervisão e avaliação, com definições e redefinições constantes.

Em especial, é importante o Sistema de Avaliação e Pesquisa, no qual trabalhavam, entre outros, Rosa Stepanenko, Tânia Dauster, Eliane Ribeiro Andrade. Nele e por ele eram promovidas pesquisas específicas sobre o desempenho do alunado. Na mesma perspectiva, o MOBRAL apoiava funcionários na realização de cursos de mestrado, viabilizando a produção de dissertações, várias defendidas na PUC-Rio e publicadas pelo Movimento. Também foi promovido, em 1983, importante seminário sobre avaliação, cujas intervenções foram registradas na publicação Avaliação em educação de adultos e adolescentes: temas e discussões.

O Acervo MOBRAL disponível no Nedeja é mais amplo do que foi digitalizado e disponibilizado nesse DVD, como pode ser visto no leia mais.

¹ As informações sobre esses programas foram retiradas do Documento Básico de 1975, complementadas com dados de relatórios e publicações dos próprios programas. O material didático do PAF foi organizado por editoras, destacando-se a Série MOBRAL.

² Motivada por este programa e pelas divergências na apuração das estatísticas relativas aos alunos alfabetizados, feito pelo MOBRAL (a mais) e pelo IBGE (a menos), foi criada em 1975 uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Ver: Senado Federal, CPI do Mobral, 1975, 2 v. Dispõe-se também de um artigo bastante crítico de Alexandra Arce, sobre os princípios e o modo de execução assumidos: Mobral e a educação de crianças menores de seis anos durante o regime militar: em defesa do trabalho voluntário (Cadernos Cedes v. 28 n. 76, p. 379-403, set./dez. 2008)

Leia mais
   
  Acervo  

 

Programas

PAF - Programa de Alfabetização Funcional

PAF - Programa de Alfabetização Funcional

Documentos

Programa de Alfabetização Funcional Documento básico treinamento de alfabetizadores pelo rádio 1973 Metologia del PAF 1973 Material de treinamento do alfabetizador
Manual de instruções para preenchimento dos questionários 1975 Caracterização de material didático 1976 Iniciativas locais: um reforço do PAF 1977 Iniciativas locais: um reforço do PAF 1978
Iniciativas locais: um reforço à ação pedagógica 1981 Sugestões de atividades ligadas à cultura 1978 Sugestões de atividades ligadas à saúde 1978 Curso de treinamento de alfabetizadores
 
Manual de instruções para a aplicação de testes + testes 1978 Roteiro de orientações ao alfabetizador 1980 PAF a sua diversificação 1981  

Série Abril

 
Alfabetização Manual do professor Alfabetização Livro de Leitura Alfabetização Livro de exercícios  
   
Alfabetização Livro de Matemática Alfabetização Guia do alfabetizador    

Série Bloch

 
Roteiro do alfabetizador Roteiro de alfabetização Roteiro exercícios de Linguagem  
 
Roteiro exercícios de Matemática Exercícios Linguagem Exercícios Matemática  

Série Lisa

Lendo e escrevendo Usando a Matemática Luís e Maria
Livro do aluno
Luís e Maria
Caderno do aluno

Série Primor

Manual do alfabetizador Leitura Matemática Exercícios de Linguagem

Série Vecchi

   
Ensinando a aprender Lendo e aprendendo    

Série MOBRAL

Roteiro de apoio e orientações Roteiro de orientação ao alfabetizador Eu faço, tu fazes
Livro do alfabetizador
Eu faço, tu fazes
Livro do aluno
 
Manual do alfabetizador Livro-caderno v.1 Livro-caderno v.2  

Série MOBRAL - PAF via TV

 
Projeto Documento de apoio legal Documento de produção  
 
Documento de avaliação Manual do monitor Livro Caderno PAF via TV  

Jogos

Bingo de números Bingo de palavras Quadra Sílabas mágicas

Diversos

Revista Agente
Ano 1 n. 1 1984
Revista Agente
Ano 1 n. 2 1985
Cartas ao domingo Mobral Conversando sobre educação de adultos 1985

 

Programa de Desenvolvimento Comunitário

Programa de Desenvolvimento Comunitário

A cartilha do povo

Você é líder

É fácil fazer contabilidade

 

Programa 9 - 14 anos fora da escola

Programa 9 - 14 anos fora da escola

Proposta de diretrizes de ação integrada 1984

 

Documentos

Documentos
Coleção Mobral
1. Mobral: sua origem e evolução 2. Programas de Atividades Culturais v.1 3. Programas de Atividades Culturais v.2 4. Metodologia para elaboração e revisão de currículo
5. Projeto de treinamento de alfabetizadores pelo rádio 6. Mobral: sistema operacional 7. A clientela do Mobral:
suas características
8. O Professor de adultos:
subsídios para formação adequada

Institucionais

Alfabetização: um projeto brasileiro 1972 Política de pesquisa e treinamento do Mobral 1972 Treinamento de alfabetizadores 1972 Seminário interamericano de educación de adultos 1973
Problemas de supervisão e avaliação 1973 Sistema Mobral 1973 Sistema Mobral 1974 Mobral informa 1974
 
Relatório 1974 a 1978 Documento básico 1975 Educação: processo de promoção humana 1975 Education:un processus de promotion humaine 1975
Relatório 1977 Relatório programas GEPED 1977 O Mobral e a educação de adultos 1978 O subsistema de supervisão global do Mobral 1978
Supervisão: aspectos práticos e teóricos 1978 O subsistema de supervisão global 1979 A ação educativa do Mobral no meio rural 1981 Relatório de 1981
 
Relatório anual de atividades 1982 Educação não-formal:
uma proposta institucional 1985
Educação através da ação comunitária Educação permanente e educação de adultos no Brasil
Mobral: uma solução para cada desafio Roteiro de ação para mobilizador Soletre Mobral e leia Brasil: cinco anos de luta Soletre Mobral e leia Brasil:
sete anos de luta

 

Ensino Supletivo

Ensino Supletivo

A Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971, que determinou a reforma do ensino de 1º e 2º graus, dedicou todo um capítulo, o quarto, ao ensino supletivo, representando a retomada da abordagem oficial da educação de adultos, após o golpe militar de 1964. O problema da alfabetização estava equacionado pela criação do MOBRAL em 1968 e sua efetiva implantação a partir de 1970; pela nova lei, previu-se a escolarização dos que não a tinham obtido na idade considerada apropriada e sua complementação, tendo em vista especialmente a formação profissional.

No Brasil, o momento era de ufanismo, com o governo ditatorial investindo em um acelerado projeto de desenvolvimento econômico. Em plano internacional, abandonando as propostas de alfabetização funcional, a UNESCO retomava a educação de adultos e investia na discussão da educação permanente. Questionava-se, na Europa, por um lado, a possibilidade dos sistemas escolares tradicionais atenderem à crescente demanda social por educação e, por outro, sua incapacidade de atender às exigências do setor econômico, em rápido processo de implantação de novas formas de produção industrial. Como alternativa, valorizavam-se as formas não escolares (ou não formais) de educação, principalmente aquelas ligadas à formação e ao aperfeiçoamento profissional, e punha-se em evidência o papel educativo da própria sociedade (educação informal).

Estas discussões chegaram ao Brasil, no início dos anos de 1970, tanto pelos documentos da UNESCO, como pelos estudos da OCDE – Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico, e foram assumidas, com conotações específicas, no Parecer n. 669/72 do Conselho Federal de Educação. Embora considerasse o potencial educativo da sociedade e defendesse, em termos, a perspectiva da autoformação constante dos documentos internacionais, na verdade este parecer propôs uma “nova escola”, tanto para aqueles que tinham a escolaridade incompleta, como para os que almejavam validar a formação obtida na vida, em geral, e no trabalho, em particular.

Essa abrangência era prevista nas diversas funções atribuídas ao ensino supletivo, conforme a Lei n. 5.692/71: suplência – suprir a escolaridade regular para adolescentes e adultos que não a tinham seguido ou concluído na idade própria; suprimento – proporcionar, mediante repetidas voltas à escola, estudos de aperfeiçoamento ou especialização para os que tinham seguido o ensino regular no todo ou em parte”; aprendizagem – formação metódica no trabalho, a cargo das empresas ou instituiçoes por elas criadas e mantidas; qualificação – profissionalização associada à formação geral.

A função suplência, a mais desenvolvida pelo Ministério da Educação nos anos de 1970 até meados dos anos de 1980, compreendia cursos supletivos e exames, em nível de 1º e 2º graus. Os exames supletivos existiam na legislação educacional brasileira desde o século XIX, chamados “de madureza”, como exames de conclusão de estudos secundários. Esta designação teria sido oficializada pela Reforma Rui Barbosa, em 1882, para definir “um exame geral de admissão aos cursos superiores, no qual se averiguasse o grau de maturidade intelectual alcançado pelo adolescente”, tendo sido assumida nas reformas posteriores, até a Lei n. 4.024/61, as primeiras Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Eram, e ainda são, habitualmente utilizados para “encurtar” o tempo de conclusão do ensino médio. A unificação dos antigos ensinos primário e secundário em ensino de 1º grau, com oito anos de duração, efetivada por esta lei, fez crescer enormemente a procura dos exames supletivos nos anos de 1970, tendo em vista principalmente a exigência do certificado deste nível que passou a ser feita pelo mercado de trabalho. Os exames supletivos de 2º grau, atualmente ensino médio, em particular, atendiam, por um lado, à aspiração de acesso ao ensino superior e, por outro, à certificação da formação obtida na experiência profissional.

A designação cursos supletivos, por sua vez, foi inicialmente aplicada às classes de emergência noturnas da Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos implantadas em todo o país pelo Ministério da Educação e Saúde, de 1947 até meados da década de 1950. Sob a designação de educação de base, como proposta pela UNESCO, ou de educação rural, que as carências brasileiras passavam a exigir, essas classes de emergência ofereciam a alfabetização de adolescentes e adultos que nunca haviam frequentado uma escola e a escolarização em nível do antigo ensino primário.

Sobretudo nas capitais, os cursos supletivos aparecem como preparação aos exames, normalmente sob a responsabilidade de instituições privadas, nem sempre idôneas. Faz parte da experiência brasileira de educação também cursos alternativos, à margem do sistema de ensino regular, desenvolvidos por meio do rádio e da correspondência e, após os anos de 1960, pela televisão.

A aprendizagem e a qualificação profissional já estavam definidas, antes da Lei n. 5.692/71 e do Parecer n. 699/72, pelo SENAI/SESI e SENAC/SESC, instituições mantidas pelas entidades patronais, com recursos provenientes de contribuição recolhida nas folhas de pagamentos, tradicionalmente vinculados ao Ministério do Trabalho.

Nos anos de 1970, o MEC dedicou especial atenção ao ensino supletivo, principalmente na função suplência. Vários projetos de cursos foram elaborados e sistematizados o controle dos exames e da certificação, assim como do financiamento, a saber: Assistência Técnica aos Estados; Andrós: estudos, pesquisas e elaboração de material didático; Producere: preparação de pessoal para o ensino supletivo; Auxília: cooperação com os sistemas estaduais e municipais de educação no planejamento e na realização de cursos e exames supletivos; Logos I e II: habilitação de professores leigos em serviço; Centro de Estudos Supletivos (CES): formulação de metodologia própria para atender à clientela do ensino supletivo; Acesso: habilitação de pessoal já engajado na força de trabalho, em atividades técnicas; Programa de Assistência Educacional ao Atleta Profissional; Projeto de Educação Supletiva para a Saúde Previdenciária, além de projetos de outros órgãos do MEC por ele supervisionados: Minerva, pelo rádio, e Conquista, pela televisão, ambos para a 2ª fase do 1º grau.

No mesmo impulso, o próprio Departamento de Ensino Supletivo (DSU) financiou também estudos sobre os cursos e exames, abrindo fértil linha de pesquisa assumida principalmente por alguns mestrados em educação criados no período, entre eles o da PUC-Rio, da UnB e o IESAE/FGV, ao lado da Fundação Carlos Chagas, de São Paulo. O conjunto dessas pesquisas, disponíveis como relatórios ou dissertações e teses e também alguns como livros, foi analisado em dois estados da arte realizado o primeiro no CEDI – Centro Ecumênico de Informação e Documentação e o segundo na Ação Educativa, que o sucedeu, ambos coordenados por Sérgio Haddad e publicados pelo MEC/INEP.¹

Por sua vez, o DSU foi replicado em praticamente todas as secretarias de educação estaduais, com pessoal próprio e verbas específicas, conforme o modo de agir tradicional da União, impondo seus projetos nos estados e municípios. Efetivamente, o MOBRAL e o Ensino Supletivo foram implantados como sistemas paralelos ao ensino regular. Comparando os dois movimentos, é bastante maior o elenco de pesquisas sobre o ensino supletivo do que sobre as atividades do MOBRAL, embora este contasse com volume significativamente maior de recursos e maior área de atuação.

O acervo disponível no NEDEJA é bastante rico. No entanto, foram digitalizados apenas os documentos considerados significativos, mas toda a coleção está preservada para consulta. Compreende artigos, relatórios, teses e dissertações, livros e estados do conhecimento, ao lado de pareceres, deliberações e projetos do MEC, em geral editados pelo próprio DSU.

¹ As teses e dissertações analisadas no segundo estado da arte citado estão disponíveis na biblioteca digital da Ação Educativa: http://www.bdae.org.br/dspace/

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Acervo

 

PAF – Programa de Alfabetização de Funcionários da UFSCar

PAF – Programa de Alfabetização de Funcionários da UFSCar

O PAF foi organizado em 1980, atendendo à solicitação dos funcionários (pessoal administrativo e de campo, zeladoria etc.) da UFSCar – Universidade Federal de São Carlos, que se organizavam visando a melhores condições de trabalho. O momento era de forte articulação e retomada de experiências de educação de adultos pela sociedade civil, iniciadas com a abertura política de 1978. Por sua vez, o Grupo de Alfabetização criado na UFSCar em junho deste ano tinha também a motivação imediata da eleição do reitor, a ser realizada em sufrágio universal.

A primeira fase dos trabalhos ocorreu entre outubro e dezembro 1980, atendendo a 40 funcionários. A retomada da proposta de alfabetização de adultos sistematizada por Paulo Freire ocorreu ao mesmo em que era discutida a importância política da educação e a função da escola no processo de socialização do conhecimento historicamente elaborado. Nesse sentido, o PAF foi um laboratório privilegiado de aprofundamento dessa problemática e de experimentação de um processo de alfabetização com a participação ativa de alfabetizandos e alfabetizadores, como momento de alfabetização dos primeiros e de formação dos segundos.

Na segunda fase do referido processo, realizada em 1981, foi organizado o Seminário de Aperfeiçoamento dos Trabalhadores, que abrangeu a pós-alfabetização e a elaboração dos Livros de Leitura 1 e 2, a partir de textos dos alfabetizandos, e a produção do jornal Participando. Esse modo de trabalhar foi inovador, envolvendo a redefinição do modo de introduzir as noções fundamentais da matemática.

O PAF é uma das experiências de alfabetização de adultos mais bem-refletida e avaliada. Além do material didático, sobre ele e a partir dele foi produzida farta e importante documentação, em termos de relatórios e textos, relacionada a seguir e em sua maior parte reproduzida neste módulo.

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  Acervo  

Fundação Educar

Fundação Educar

A Fundação Educar foi criada pelo Decreto n. 92.374, de 06/02/86, no início do Governo Sarney, designado como “Nova República”, em substituição do MOBRAL, extinto na mesma oportunidade. Seus objetivos eram:

a) apoiar instituições governamentais e não governamentais que desenvolvessem educação básica de jovens e adultos, por meio de cooperação técnica e/ou recursos financeiros e materiais, a fim de contribuir para a ampliação desse atendimento;

b) promover a realização de programas da 1ª fase da educação básica para a população de 15 ou mais anos que não teve acesso à escola, ou que dela foi excluída prematuramente, fomentando o desenvolvimento de projetos junto a instituições governamentais, com vista à absorção progressiva desse atendimento pelos sistemas estaduais e municipais; e apoiando instituições da sociedade civil que atendam aos objetivos do desenvolvimento da educação básica de jovens e adultos.

Definia-se como órgão de coordenação e não de execução e previa a descentralização regional de suas ações, atuando junto às secretarias e instituições, por meio de dois projetos: PEB – Educação Básica e PRONEI – Programa Nacional de Educação Integral (1ª a 4ª séries), para os quais foram produzidos materiais didáticos específicos.

A Fundação Educar realizou um importante projeto de alfabetização de jovens e adultos, por meio de parcerias com diversas entidades representativas dos movimentos populares da Baixada Fluminense (federações e associações de moradores, clubes de mães, comunidades eclesiais de base etc.). Abrangeu os municípios de Duque de Caxias, Nova Iguaçu e São João de Meriti e durou de fevereiro de 1986 a março de 1990, período político de redemocratização do país e de fortalecimento e reconhecimento dos movimentos populares.

A Fundação Educar recebeu da UNESCO, em 1988, o Prêmio Nadeja Kroupshkaia pela experiência, considerada a melhor, entre as concorrentes, na área de educação de jovens e adultos com participação comunitária. Está bem-documentada, tanto pelo Subprojeto de Avaliação do Projeto de Educação Básica para a Baixada Fluminense, como pelas dissertações de Eliane Ribeiro Andrade, Nos limites do possível: uma experiência político-pedagógica na Baixada Fluminense, e de Adriana Oliveira Lima, Alfabetização de jovens e adultos e a reconstrução da escola, ambas defendidas no Instituto de Estudos Avançados em Educação da Fundação Getúlio Vargas.

Juntamente com outros órgãos federais, foi extinta em 1990, no início do Governo Collor. Pelo desmonte efetuado, não se conseguiu obter todos os documentos produzidos. O acervo em anexo indica as publicações que se sabe terem existido e o que foi digitalizado.

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Acervo

 

PEJ - PEJA

PEJ   – Programa de Educação Juvenil
PEJA – Programa de Educação de Jovens e Adultos

O PEJ foi criado em 1985-1986, como uma das metas do Programa Especial de Educação, elaborado sob a coordenação de Darcy Ribeiro, vice-governador e secretário de educação na gestão de Leonel Brizola como governador do estado do Rio de Janeiro. Foi implantado majoritariamente nos CIEPs – Centros Integrados de Educação Pública do município do Rio de Janeiro, quando Maria Yeda Linhares era a secretária de educação. Mais tarde, expandiu-se por outros municípios do estado, principalmente na região serrana.

Sua proposta inicial assumia como pressupostos teórico-metodológicos a pedagogia freireana e apresentava como base a interdisciplinaridade, considerada como um processo de trabalho no qual os conteúdos e objetivos de cada disciplina deveriam convergir na proposta metodológica. O ponto de partida era a alfabetização, entendida em sentido amplo e articulada à noção de cidadania. A estrutura do programa previa turmas pequenas, atendidas por professores especialmente preparados. Seu currículo era inovador, compreendendo Matemática, Realidade Social e Cidadania, Saúde, Educação Física e Cultura, interligadas à dinâmica da Alfabetização. A entrevista realizada com José Pereira Peixoto Filho, em março de 2005, e a dissertação de Marilda de Jesus Henriques, Programa de Educação Juvenil: uma nova proposta de alfabetização de adolescentes, defendida em 1988 na Universidade Federal do Rio de Janeiro, ambas reproduzidas neste documentário, historiam e analisam esta primeira fase.

Após as novas Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n 9.394/96), o Programa passou aceitar formalmente a matrícula de adultos, mudando sua designação para PEJA. Um histórico e uma breve análise sobre sua criação e seu desempenho, no período 1986-2000, consta do relatório de pesquisa elaborado por Osmar Fávero, Eliane Ribeiro Andrade e Ana Karina Brenner, “Programa de Educação de Jovens e Adultos (PEJA)”, publicado no livro Novos caminhos em Educação de Jovens e Adultos – EJA; um estudo de ações do poder público em cidades de regiões metropolitanas brasileiras, coordenado por Sérgio Haddad (São Paulo: Global e Fapesp, 2007).

O PEJA funciona até hoje, oferecendo os dois segmentos do ensino fundamental, com os componentes curriculares organizados em blocos, que são desdobrados em unidades de progressão, desenvolvidos em dias-aula e não em horas-aula. Conta também com um sistema de avaliação continuada que possibilita aos alunos ingressarem a qualquer tempo em um bloco mais adiantado, desde que tenham desempenho satisfatório no bloco anterior. Essa organização didática foi precursora dos ciclos atuais.

No período 2000-2009, o PEJA sistematizou um processo de formação de seu quadro de pessoal, assumido como política pública pelo município do Rio de Janeiro. Foram realizados três cursos breves de atualização, em convênio com a PUC-Rio e a UFF, atuando inicialmente em polos geográficos e após em minicursos nos campi universitários. Esses cursos motivaram a realização de três cursos regulares de especialização, por meio de convênio com a Universidade Estácio de Sá. Muitos dos egressos desses cursos concluíram ou estão frequentando o mestrado e vários estão chegando ao doutorado.

Didáticos

Didáticos

PEJA I e II - A Multieducação na sala de aula 2007

PEJA I
Leitura e escrita
PEJA I
Matemática
PEJA I
História e Geografia
PEJA I
Multieducação temas em debate
PEJA II
Língua portuguesa
PEJA II
Matemática
PEJA II
Língua estrangeira
PEJA II
Linguagens artísticas

PEJA II - História e Geografia (material experimental) 2008

Bloco 1
Caderno do professor
Bloco 1
Caderno do aluno
Bloco 2
Caderno do professor
Bloco 2
Caderno do aluno

PEJA I e II - Orientações curriculares 2010

 
Língua Portuguesa Matemática História e Geografia  
 
Ciências Línguas Estrangeiras Linguagens Artísticas  

PEJA II - Cadernos para alunos 2010

Língua Portuguesa
BL1 UP1
Língua Portuguesa
BL1 UP2
Língua Portuguesa
BL1 UP3
Língua Portuguesa
BL2 UP1
Língua Portuguesa
BL2 UP2
Língua Portuguesa
BL2 UP3
Matemática
BL1 UP1
Matemática
BL1 UP2
Matemática
BL1 UP3
Matemática
BL2 UP1
Matemática
BL2 UP2
Matemática
BL2 UP3
História e Geografia
BL1 UP1
História e Geografia
BL1 UP2
História e Geografia
BL1 UP3
História e Geografia
BL2 UP1
História e Geografia
BL2 UP2
História e Geografia
BL2 UP3
Espanhol UP1 Espanhol UP2
Espanhol UP3 Inglês
BL2 UP1
Inglês
BL2 UP2
Inglês
BL2 UP3
 
Francês
BL II UP 1
Francês
BL II UP 2
Francês
BL II UP 3
 

PEJA II - U.P.3 - Educação à distância 2012

 
Língua Portuguesa Matemática História e Geografia  
   
Ciências Língua Estrangeira    

PEJA I - Desafios e Possibilidades 2013

Língua Portuguesa Matemática Estudos da Sociedade Ciências

 

Vídeo

Vídeo
 

 

MOVA – Movimento de Alfabetização

MOVA – Movimento de Alfabetização

O MOVA foi organizado quando Paulo Freire assumiu a Secretaria Municipal de Educação, na gestão de Luiza Erundina na Prefeitura de São Paulo (1989-1992). Incorporou na Secretaria de Educação as ações de alfabetização que eram coordenadas pela Secretaria de Bem-Estar Social, abrindo nova frente na alfabetização dos maiores de 15 anos, em uma ação conjunta do poder municipal e dos movimentos sociais. Significou, simultaneamente, a superação da visão assistencialista da alfabetização e nova postura política, representada na parceria entre o poder público e organizações da sociedade civil.

Nos anos de 1990, o MOVA expandiu-se por vários outros municípios, especialmente os administrados por quadros do 
PT – Partido dos Trabalhadores, mas nem sempre nas mesmas bases de cooperação entre o poder público e o movimento social. Teve expressão particular no Rio Grande do Sul, implantado em vários municípios a partir de 1999. O livro coletivo De Angicos a Ausentes: 40 anos de educação popular, organizado por Carlos Rodrigues Brandão e publicado pelo MOVA-RS e pela Corag, em 2001, apresenta as propostas do MOVA no Rio Grande do Sul, relata algumas experiências fundantes e identifica as pessoas por elas responsáveis. Em São Paulo, com o término da gestão petista, o MOVA foi extinto em 1992, mas foi relançado na administração de Marta Suplicy (2000-2004).

Neste documentário, estão reproduzidas as dissertações de Pedro Pontual, Desafios pedagógicos na construção de uma relação de parceria entre movimentos populares e o governo municipal da cidade de São Paulo na gestão Luíza Erundina: a experiência do MOVA-SP, defendida na PUC-SP em 1995, e de Sílvia de Andrade Tellles, Todo ser humano tem condição de construir conhecimento – uma experiência de formação de educadores, em parceria entre movimentos populares e governo municipal da cidade de São Paulo: o Projeto MOVA 1989-1992, defendida na Universidade Federal Fluminense em 1998, que traz como anexos documentos importantes do movimento, no período inicial. Estão reproduzidos também outros documentos desse mesmo período (1990/1992) e a coleção Círculos de Formação, publicada em 2001/2004.

A partir de 2003 o projeto passou as ser apoiado pela Petrobrás, por meio da Federação Única dos Petroleiros, expandindo-se por todo o país. Essa expansão está fartamente ilustrada no livro-documento MOVA-Brasil 10 anos, organizado por Moacyr Gadotti e publicado em 2013 pelo Instituto Paulo Freire. Um CD anexo ao livro, aqui reproduzido, traz, além da íntegra do livro, os Cadernos de Formação editados em 2011, livros anuais do MOVA, almanaque e boletins informativos publicados ao logo dos anos, assim como vídeos apresentando os primeiros resultados do projeto, a formatura de uma de suas turmas em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, e o Programa Petrobrás Fome Zero e Desenvolvimento e Cidadania.

Projeto Zé Peão

Projeto Zé Peão

Criado em João Pessoa, na Paraíba, em 1990, no bojo da renovação da luta sindical, o Projeto Escola Zé Peão é um forte exemplo da proposta de uma ação educativa para atender a um movimento social. A constatação de que a maioria dos operários que trabalhava nos canteiros de obra não era sequer alfabetizada fez a diretoria do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário de João Pessoa (Sintricom) procurar o Centro de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) para a realização de um projeto de alfabetização.

Esta relação entre o Sintricom e a UFPB estabeleceu nova maneira de trabalhar. A presença dos trabalhadores da construção civil nos momentos de elaboração da proposta, assim como em sua execução e avaliação permanente, criou um trabalho em conjunto no qual a realidade desses trabalhadores ocupou lugar central.

O grande desafio estava em fazer uma escola que não fosse aquela que os operários conheciam por sua ausência e suas falhas. Para isto, foi importantíssima a decisão das aulas acontecerem nos canteiros de obras, requerendo o deslocamento dos professores do Centro de Educação para os locais reservados ao Projeto.

A proposta curricular, traduzida na metodologia e expressa no material didático, conferiu ao Projeto seu caráter inovador e a possibilidade de ser um projeto em construção permanente. É coerente com seus princípios fundantes, garantindo a proximidade com o trabalhador da construção civil, o respeito a seu saber e o reconhecimento deste saber em uma relação dialógica com o processo de aprendizagem. Quanto ao material didático, a elaboração do texto Benedito significou o esforço de traduzir a vida do trabalhador da construção civil para o mundo da leitura e da escrita.

Os educandos são jovens e adultos, na faixa etária dos 20 aos 60 anos, a maioria vinda do interior do estado, normalmente trabalhando e morando nos canteiros de obras. O Projeto oferece dois programas básicos: o APL – Alfabetização na 1ª Laje, que atende às necessidades dos trabalhadores-alunos sem escolarização prévia, com ênfase na Linguagem e na Matemática; e o TST – Tijolo sobre Tijolo, destinado aos operários com domínio elementar da leitura e da escrita, buscando ampliar o domínio do saber sistematizado, a partir de sua experiência de vida e da realidade do aluno-trabalhador.

São realizados ainda vários programas de apoio: a Biblioteca Volante, com o objetivo de facilitar o acesso ao livro e estimular o gosto pela leitura e o desejo de escrever; a Varanda Vídeo, que traz o mundo para a sala de aula, funcionando como recurso auxiliar na formação cultural do aluno-trabalhador; a Oficina de Arte e as Atividades Culturais, que visam a contribuir para o desenvolvimento dos alunos-trabalhadores como seres sociais, culturais e históricos.

As aspirações para futuro próximo é ampliar a ação em cidades do interior, garantir o ensino fundamental completo e viabilizar a continuidade dos estudos. Em anos passados, duas turmas já conseguiram isto e alguns operários cursaram o ensino médio e tiveram acesso à universidade. Para tanto, é essencial superar a condição estrutural de “projeto”, que obriga seus coordenadores a recorrerem todos os anos a editais para a obtenção de verbas, nem sempre com regularidade assegurada. Ao mesmo tempo, precisa obter apoio decisivo da Secretaria Estadual de Educação, principalmente na oferta de ensino médio adequado às condições dos operários.

Os professores-alfabetizadores do Projeto Zé Peão são alunos dos cursos de licenciatura da UFPB, que recebem bolsa para seu trabalho. As atividades complementares são organizadas por voluntários, a maioria professores da própria UFPB.

Ainda que o Projeto tenha obtido reconhecimento e prêmios nacionais, como o Prêmio Educação para a Qualidade do Trabalho, a Medalha Paulo Freire, e internacionais como o da UNESCO, e tenha mantido intercâmbio com a Universidade de Illinois nos anos de 1990, isto não lhe garantiu reconhecimento que resultasse em valorização e apoio efetivo para sua manutenção. De resto, é um desafio avançar no nível de institucionalidade sem perder as especificidades da proposta.

No decorrer dos 20 anos de experiência, o Projeto Zé Peão contribuiu decisivamente para a formação de professores de educação de jovens e adultos, educadores que hoje atuam como regentes nas diferentes redes de ensino, gerentes educacionais e professores de ensino superior. No entanto, embora obtenha forte impacto sobre a formação dos professores alfabetizadores, em termos institucionais não tem causado impacto maior no Centro de Educação. Os universitários só têm contato com a educação de jovens e adultos ao final do curso de Pedagogia, o que torna difícil a identificação de um número maior deles com o público e com a modalidade. Há sugestões no sentido de regulamentar o Projeto como um espaço de estágio e se chegou mesmo a pensar em criar uma escola de aplicação de educação de jovens e adultos na UFPB, na qual fosse possível experimentar novos conhecimentos e novos métodos, a partir da experiência bem-sucedida de 20 anos do Projeto Zé Peão.

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SEJA/POA

SEJA/POA – Secretaria de Educação de Jovens e Adultos da Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre

No período 1989/2004, nos 16 anos da administração da coligação liderada pelo PT – Partido dos Trabalhadores, no Rio Grande do Sul, cujo carro-chefe foi o Orçamento Participativo e, em sua decorrência, a prioridade dada ao projetoEducação Cidadã, foi implantada inovadora política pela SEJA – Secretaria de Educação de Jovens e Adultos de Porto Alegre, que se irradiou pelos municípios vizinhos. Sua melhor expressão ocorreu no CMET – Centro Municipal de Educação dos Trabalhadores Paulo Freire, de Porto Alegre.

Assim como no PEJ/PEJA e no MOVA, essa política assume os princípios da educação popular e da educação de adultos, fortemente baseada na pedagogia de Paulo Freire. No período, definiu uma proposta inovadora: as totalidades do conhecimento e, a partir dela, elaborou uma nova proposta curricular, na qual o saber adquirido na experiência de vida é ponto de partida para a aquisição do saber historicamente acumulado e considerado necessário para a formação pessoal e a prática social.

Caderno Pedagógico n. 8, que traz a concepção de Totalidade de conhecimentos definida como base teórico-metodológica para as instituições que desenvolviam a EJA, e a série Cadernos de Trabalhador, ambos publicados pela SEJA/POA, configuram-se como material didático bastante original, concretizando a proposta elaborada e demonstrando os resultados da experiência. Ambos estão reproduzidos neste documentário.

Caderno Pedagógico

Caderno Pedagógico

Totalidades de conhecimento