Governo do Estado não cumpre acordos sobre educação nas prisões
Em março, o Grupo de Trabalho e Defesa do Direito à Educação nas Prisões, do qual do Fórum de EJA do Estado de São Paulo integra e que luta pelos direitos educativos de pessoas encarceradas, reuniu-se para discutir a continuidade da participação no Grupo de Trabalho para proceder à elaboração da proposta pedagógica para educação básica nas prisões no Estado de São Paulo, formado pela Secretaria Estadual de Educação (SEE) e Secretaria de Educação Penitenciária (SAP) e convidados.
Na ocasião, decidiu-se pela saída do Grupo do referido GT tendo em vista o descumprimento, por parte da SEE e SAP, dos acordos referentes à realização de consulta pública sobre a Resolução Conjunta Nº 1/2013, que estabelece a elaboração do plano estadual de educação nas prisões.
A nota de saída está exposta na íntegra a seguir.
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Ao Sr. José Renato Nalini
Secretário de Educação do Estado de São Paulo
Ao Sr. Lourival Gomes
Secretário de Administração Penitenciária de São Paulo
A Sra. Letícia Maranhão Matos
Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN)
A Sra. Carolina Bessa
Núcleo de Inclusão Educacional da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo
Aos Membros do Grupo de Trabalho para proceder à elaboração de proposta pedagógica para educação básica nas prisões no estado de São Paulo
Assunto: Desligamento do Grupo de Trabalho (GT) para elaboração da Proposta Pedagógica para a Educação Básica nas prisões no Estado de São Paulo e pedido de providências sobre o Plano Estadual de Educação nas Prisões de São Paulo
São Paulo, 23 de março de 2016.
O Grupo em Defesa do Direito à Educação nas Prisões – composto pelas organizações Ação Educativa; Conectas Direitos Humanos; Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública; Geledés Instituto da Mulher Negra; Instituto Terra Trabalho e Cidadania; Instituto Práxis; Pastoral Carcerária e Fórum de Educação de Jovens e Adultos/SP – vem informar seu desligamento do Grupo de Trabalho (GT) para elaboração da Proposta Pedagógica para a Educação Básica nas prisões no Estado de São Paulo[1].
O GT foi criado em agosto de 2015 pela Secretaria Estadual de Educação em parceria com a Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo. A convite de SEE/SP, aceitamos participar das reuniões que ocorreram na sede da Secretaria de Educação do Estado[2] e contribuir para o aprimoramento e planejamento da política recém-estruturada.
O motivo do desligamento das organizações que compõem o Grupo em Defesa do Direito à Educação nas Prisões é o não cumprimento dos acordos contidos no Plano de Trabalho, elaborado em setembro de 2015, que previa, sobretudo, a formalização do GT por meio de uma Resolução Conjunta SE/SAP.
Além disso, a ampla participação da sociedade civil na construção e implementação da política foi uma das condições para que as organizações fossem parte do GT da SEE/SAP. Este acordo também não foi cumprido em decorrência da Secretaria de Educação e da Secretaria de Administração Penitenciária terem desconsiderado as propostas resultantes do processo da Consulta Pública sobre o Plano Estadual de Educação nas Prisões, publicada no Portal da SEE em meados de agosto e inicio de setembro de 2015. O Grupo em Defesa do Direito à Educação nas Prisões compreende que a participação não pode se resumir a um ritual burocrático e ela somente é efetiva quando gera consequências para a política pública.
Desde a aprovação das Diretrizes Nacionais para a Educação de Pessoas Privadas de Liberdade (Resolução CNE n. 2/2010) o Grupo de entidades reivindica maior participação da sociedade civil – por meio de processos e espaços institucionalizados a partir de convocatória pública - no planejamento, controle social e adequação da política estadual de educação nos presídios às Diretrizes Nacionais elaboradas pelo Conselho Nacional de Educação.
Reconhecemos a importância: das mudanças provocadas pela Resolução Conjunta SE/SAP n. 1/2013; da iniciativa de SEE/SP de elaborar um Plano Estadual de Educação nas Prisões; e de colocá-lo disponível para Consulta Pública no site da Secretaria. Porém, questionamos a inconsistência do documento de SEE/SAP submetido à Consulta Pública, a falta de consolidação das propostas e a ausência de devolutiva pública sobre seus desdobramentos. Na versão disponibilizada do Plano Estadual de Educação nas Prisões de São Paulo, apresentada para a Consulta Pública, sente-se falta de ações específicas, prazos e responsáveis para o cumprimento das metas.
Além disso, os dados presentes no Diagnóstico – sem a explicitação das fontes de pesquisa e metodologia – comprovam que o atendimento educacional em São Paulo é bastante insuficiente e incipiente. Entretanto, nas metas, está previsto o aumento em apenas 10% da oferta no biênio, seguindo um padrão inercial de atendimento, ou seja, mantendo o limitado patamar do atual serviço ofertado. Conclui-se que o diagnóstico não subsidia efetivamente a construção das metas. Não há metas sobre a aplicação da Lei de Remição por estudo e nem mesmo informações sobre o perfil da população carcerária paulista.
Há no documento apresentado um histórico sucinto que oferece poucas informações sobre o que já foi feito. Exemplo disso é a informação de que houve formação de professores, mas não há explicação de que tipo de trabalho foi realizado. Também não há informação sobre os educadores e nem o tipo de vínculo que mantém com a rede. Não se sabe nem mesmo quantos professores trabalham em educação nas unidades prisionais do estado.
Outro problema do texto é a naturalização da primazia do Trabalho em relação á Educação, como se não fosse possível dar maior foco ao atendimento educacional. Faz referência também à concorrência com o horário de trabalho, mas não oferece qualquer indicação ou proposta de alteração das rotinas nas unidades que possibilitem a melhoria das condições de estudo das pessoas encarceradas. Destaca-se também que não há explicitação quanto às responsabilidades da FUNAP no atendimento educacional, que se confunde com as das Secretaria de Educação ao longo do documento.
Diante disso, fica evidente a necessidade de rever e ampliar a proposta do Plano para que se possa incluir um diagnóstico mais preciso, além de indicações curriculares, metas mais nítidas, prazos e responsabilidades definidas.
Embora tenhamos participado do GT, das discussões, debates e questionamentos, compreendemos que não nos cabe – como sociedade civil – formular metas objetivas e estratégias de ação. É o Estado de São Paulo o responsável por apresentar suas metas iniciais e debate-las com a sociedade, em uma instância que possibilite a participação ampla; não restrita a convidados.
Assim, reafirmamos a urgência da Secretaria de Educação de São Paulo consolidar as contribuições da Consulta Pública sobre o Plano Estadual de Educação nas Prisões e realizar uma devolutiva da proposta para a população paulista em audiência pública – convocada com antecedência e amplamente divulgada. Nosso entendimento é de que o Plano deve ser detalhado; acrescido de informações diagnósticas relevantes para o planejamento da política, de metas objetivas e de cronograma de execução. Uma vez finalizado em nova versão, o documento do Plano deve ser divulgado amplamente e submetido ao debate em uma audiência pública com participação irrestrita.
Também é importante garantir a existência de uma instância permanente de acompanhamento e monitoramento externo da política pública de educação nas prisões. Para além dessa instância, a ser composta por representantes do governo, da sociedade civil e de universidades, propomos a criação de uma ouvidoria externa, a exemplo da existente na Defensoria Pública de São Paulo e em outras instituições públicas.
A construção participativa de seus parâmetros possibilitará que o Plano Estadual de Educação nas Prisões de São Paulo ganhe maior legitimidade social e possa se constituir em referência para outros estados brasileiros no que ser refere ao grande desafio de garantir o direito humano à educação a toda população encarcerada do país.
Aguardamos novas versões da formulação do Plano Estadual e a convocação de audiência pública. Além do processo de planejamento participativo, demanda-se também a criação de uma instância permanente de monitoramento e controle social dos termos, metas e cronograma estabelecidos no Plano Estadual de Educação nas Prisões de São Paulo, devidamente formalizada por meio de Resolução pública.
Cordialmente,
Grupo de Trabalho em Defesa do Direito à Educação nas Prisões
Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Informação
Conectas Direitos Humanos
Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo
Geledés Instituto da Mulher Negra
Instituto Práxis de Direitos Humanos
Instituto Terra Trabalho e Cidadania (ITTC)
Pastoral Carcerária
Fórum de Educação de Jovens e Adultos de São Paulo
[1] Representação exercida até o momento por Claudia Bandeira, assessora da Ação Educativa.
[2] Dias 25 de agosto, 21 de setembro, 05 de outubro, 30 de novembro de 2015 e 07 de março de 2016.
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