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Tese

O presente estudo, intitulado "Juventude negra na EJA: os desafios de uma política pública", teve como finalidade analisar a constituição da oferta de EJA na Rede Municipal de Ensino de Florianópolis, na perspectiva de identificar os impactos e alcances desta modalidade de ensino para a juventude negra. A problemática da pesquisa inscreve-se em um contexto em que emergem iniciativas de políticas de educação, focalizadas para a população negra. Nossa hipótese ancorou-se na compreensão de que a política de EJA da RME de Florianópolis, embora declare sua centralidade nos sujeitos, não integra o reconhecimento étnico-racial e geracional como dimensões valorizadas nos processos e nos instrumentos que concretizam esta oferta educacional. A escolha da RME de Florianópolis, como campo empírico, deve-se à expressiva presença de jovens negros (35,3%) na EJA, se considerada a população negra da cidade, que é em torno de 10,6%; a proposta pedagógica divulgada como inovadora; e a trajetória de implementação da educação para as relações étnico-raciais nessa rede de ensino. Foram focalizados quatro núcleos de EJA a partir dos critérios de maior presença negra e distribuição geográfica. No percurso metodológico, foram realizadas observações de práticas do cotidiano da EJA e entrevistas com jovens e profissionais da EJA. Também, foram analisados documentos que orientam a política de EJA em âmbito nacional e municipal e os que orientam as políticas de promoção da igualdade racial, os quais foram essenciais para identificar as expectativas e os alcances na implementação de ambas as políticas. Para contribuir com a análise da referida problemática, dialogou-se com diferentes campos: História, Sociologia e Educação, mas, buscou-se, prioritariamente, interlocução com estudiosos da Educação de Jovens e Adultos (Di Pierro, Haddad, Machado, Arroyo, Dayrell, Carrano, Charlot) e com estudiosos das relações raciais no Brasil (Fonseca, Gomes, Gonçalves e Silva, Guimarães). A trajetória histórica de desigualdades a que está submetida a população negra na educação, foi traçada com a intenção de apresentar a responsabilidade do Estado brasileiro na construção e legitimação do racismo como prática social. Esse histórico desigual abrange outras dimensões da vida de homens e mulheres negros e vai se materializar na situação da juventude negra em tempos atuais. A configuração da oferta e a constituição da docência para esta modalidade educativa vão desvelando os marcadores que orientam as nossas análises sobre os alcances da sua política educacional para os jovens negros e revelam os impedimentos e as interdições aos estudantes da EJA para sua formação humana integral. A arquitetura curricular, na perspectiva do "interesse", como mobilizador dos processos formativos de jovens e adultos, integra a análise do que é anunciado como proposta pedagógica e do que é efetivado no currículo em ação. Este estudo revela que a complexidade do fazer pedagógico na EJA se transforma em desafio quando as expectativas dos profissionais, em relação aos jovens, estão permeadas de negatividades sobre "as juventudes", em maior proporção quando os jovens são negros. E evidencia que a lógica de funcionamento da EJA da RME de Florianópolis ainda não integra a educação das relações étnico-raciais como elemento estruturante da formação humana que desenvolve, contribuindo, assim, para a reprodução da desigualdade e do racismo. Isso se deve ao pensamento hegemônico da "convivência pacífica" apreendido do mito da democracia racial e ao modelo explicativo que tem as "classes sociais" como referência para explicação das desigualdades. Essas concepções vão impregnar a EJA de uma visão universalista de política pública cada vez mais distanciada dos sujeitos jovens negros e também dos atuais debates e formulações sobre a reconfiguração e identidade dessa modalidade educativa. O exercício empreendido neste estudo tem por fim afirmar a necessária superação de uma concepção "universalista" na modalidade de educação para jovens e adultos em favorecimento de uma abordagem que agregue tanto a dimensão da singularidade (pertencimento étnico-racial, reconhecimento) como a dimensão da igualdade (redistribuição), para que a EJA se torne de fato emancipatória.
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