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Apresentação

O CPC nasceu em 1961 na UNE – União Nacional de Estudantes, por proposta de integrantes do Teatro de Arena, que vieram ao Rio de Janeiro trazer a peça Eles não usam black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri. A proposta teórica original foi escrita por Carlos Estevam, primeiro presidente do CPC e publicada no livro A questão da cultura popular, do qual se destaca o Manifesto do Centro Popular de Cultura. Essa concepção foi discutida a seguir por Ferreira Gullar, segundo presidente do CPC, em A cultura popular posta em questão. As origens do CPC foram descritas e analisadas por Manoel Tosta Berlink no relatório de pesquisa Um projeto para a cultura brasileira nos anos 60: análise sociológica do Centro Popular de Cultura.

Normalmente a referência é feita ao CPC da UNE sediado no Rio de Janeiro, que teve maior liderança e projeção. Mas, por meio da UNE/Volante, realizada em 1962/1963, foram criados CPCs estaduais, alguns nas próprias uniões estaduais de estudantes excepcionalmente, até em faculdades. Várias dessas experiências estão indicadas nas entrevistas publicadas por Jalusa Barcellos em CPC da UNE; uma história de paixão e consciência.

Pela sua importância, a maioria dos textos disponíveis do CPC ou sobre o CPC está transcrita ou pelo menos referida no módulo Documentos. Por ser renovador e radical, o CPC é um dos movimentos mais lembrado e o mais criticado, especialmente por Marilena Chauí, em “Considerações sobre alguns Cadernos do Povo Brasileiro e o Manifesto do CPC”, publicado no livro Seminários sobre o nacional e o popular na cultura brasileira,  e por Heloísa Buarque de Hollanda em  “O engajamento cepecista”, no livro Impressões de viagem: CPC vanguarda e desbunde, 1960/1979. Em Livros, encontram-se várias resenhas e alguns textos integrais.

O CPC da UNE e a maioria dos CPCs criados nos diversos estados e faculdades definem-se expressamente como de cultura popular.  Nesse sentido, a designação  “material didático” para sua produção – música, peças de teatro, filmes, folheto de cordel, poesia – é utilizada em sentido lato. No entanto, em alguns estados, como em Goiás e Minas Gerais, as equipes trabalharam com alfabetização, produzindo cartilhas e livros de leitura.  No módulo Didáticos, foram inseridos alguns materiais impressos: o cordel Bumba-meu-boi,  de Capinam, representado pelo CPC/Bahia; o Livro de Leitura para Adultos,  do CPC/Goiás e a cartilha Uma família operária, do CPC/Belo Horizonte, assim as poesias divulgadas no Violão de Rua. Essa publicação fazia parte da série Cadernos do Povo, da Editora Civilização Brasileira, cujos exemplares, segundo Ênio da Silveira, seu diretor, eram vendidos pelo CPC para financiar suas atividades.

Os textos da peça Brasil, versão brasileira, de Oduvaldo Viana Filho e do Auto dos 99%, que introduzia, no período, a discussão sobre a reforma universitária, podem ser encontrados no módulo Teatro. Colocou-se nele também a parte inicial da reencenação do Auto dos 99%,  feita durante a 43ª Reunião Anual da SBPC, em julho de 1991,  no Teatro de Arena da UFRJ, na Praia Vermelha,  mesmo local em que foi apresentado pela primeira vez, em 1962. Nesta parte inicial, vários artistas que foram do CPC o apresentaram e homenagearam os colegas falecidos.

Em Áudio, foram copiadas as cinco músicas do long-play compacto O Povo Canta, produzido pelo CPC da UNE em 1962: Canção do subdesenvolvido, de Carlos Lyra e Francisco de Assis; João da Silva ou o falso nacionalista, de Billy Blanco; Canção do trilhãozinho, Carlos Lyra e Francisco de Assis; Grileiro vem  pedra vai, de Raphael de Carvalho; e Zé da Silva é um homem livre, de Geni Marcondes e Augusto Boal. Reproduziu-se também o álbum que envolve o disquinho: capa, apresentação e letras das músicas.

Quanto à produção cinematográfica, o único filme produzido pelo CPC da UNE foi Cinco vezes favela, considerado um dos marcos do Cinema Novo brasileiro, inserido no módulo Filmes.  Compreende cinco episódios: Um favelado, de Marcos Farias; Zé da Cachorra, de Miguel Borges; Couro de Gato, de Joaquim Pedro; Escola de samba, alegria de viver, de  Carlos Diegues; Pedreira de São Diogo, de Leon Hirszman. Por estar mais próximo da temática da educação popular no período, no entanto, inseriu-se, neste módulo, as cenas iniciais do filme Cabra marcada para morrer, de Eduardo Coutinho. A produção desse filme teve início em fevereiro de 1964, como um trabalho conjunto do CPC e do MCP, explorando o assassinato de João Pedro Teixeira, líder da Liga Camponesa de Sapé, em 1962,  mas foi interrompida imediatamente após o golpe militar de 1964. O material revelado foi descoberto por acaso vinte anos depois e a filmagem foi retomada, tendo como base longo depoimento de Elizabeth Teixeira, viúva de João Pedro e depoimentos complementares de seus filhos. Lançado em 1984, é considerado um dos melhores documentários sobre a histórica brasileira recente.

Os CPCs foram um celeiro de jovens artistas que se projetaram no cenário artístico e cultural brasileiro, entre eles: como ideólogos, Carlos Estevam Martins, Gianfrancesco Guarnieri, Luís Werneck Vianna, Ferreira Gullar; no teatro e na televisão, Oduvaldo Vianna Filho (Vianinha), Armando Costa, Capinam, Cecil Thiré, Carlos Miranda, Carlos Vereza, Francisco de Assis, Chico Nelson, Denoy de Oliveira, Fernando Peixoto, Flávio Migliaccio, João das Neves, João Siqueira, Joel Barcelos, Nelson Xavier, Paulo Pontes, Pichin Plá; no cinema, Cacá Diegues, Eduardo Coutinho, Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirszman, Maurice Capovilla, Marcos Farias, Miguel Borges; na poesia, Affonso Romano de Sant’Anna, Chico Nelson, Ferreira Gullar, Moacyr Félix; na música: Carlos Lyra, Sérgio Ricardo. Entre todos, uma das pessoas que mais se dedicou ao CPC foi Vianinha, como se pode comprovar pelo livro Vianinha, cúmplice da paixão, escrito por Denis de Moraes. 

Após o desmonte do CPC da UNE, parte do grupo criou o Teatro Opinião, no Rio de Janeiro, cujas primeiras realizações foram o musical Opinião, que estreou em dezembro de 1964, com texto de Armando Costa, Oduvaldo Vianna Filho, Paulo Pontes e músicas de Zé Keti e João do Vale, com a participação de Nara Leão, Zé Keti e João do Vale; e Liberdade, liberdade, de Flávio Rangel e Millôr Fernandes, que estreou em abril de1965, com Paulo Autran.

Para entender o CPC, é importante entender a mobilização e a participação dos estudantes na política nacional no período, especialmente por meio da UNE. Dispõe-se de bons livros para isto, entre eles: Maria Alice Foracchi M. O estudante e a transformação da sociedade brasileira (São Paulo: Nacional, 1965); João Roberto Martins Filho. Movimento estudantil e ditadura militar, 1964-1968 (Campinas: Papirus, 1987); José Artur Poerner. O poder jovem: história da participação política dos estudantes brasileiros (2ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979); José Luiz Sanfelice. Movimento estudantil: a UNE na resistência ao golpe de 64 (São Paulo: Cortez e Autores Associados, 1986); Maria de Lourdes de Albuquerque Fávero. A UNE em tempos de autoritarismo (Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 1995); Nilton Santos (org.). História da UNE; depoimentos de ex-dirigentes (São Paulo: Livramento, 1980); e a brochura UNE: Luta atual sobre a reforma universitária (Cadernos de Coordenação Universitária, dez. 1963).