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Ensino Supletivo

Ensino Supletivo

A Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971, que determinou a reforma do ensino de 1º e 2º graus, dedicou todo um capítulo, o quarto, ao ensino supletivo, representando a retomada da abordagem oficial da educação de adultos, após o golpe militar de 1964. O problema da alfabetização estava equacionado pela criação do MOBRAL em 1968 e sua efetiva implantação a partir de 1970; pela nova lei, previu-se a escolarização dos que não a tinham obtido na idade considerada apropriada e sua complementação, tendo em vista especialmente a formação profissional.

No Brasil, o momento era de ufanismo, com o governo ditatorial investindo em um acelerado projeto de desenvolvimento econômico. Em plano internacional, abandonando as propostas de alfabetização funcional, a UNESCO retomava a educação de adultos e investia na discussão da educação permanente. Questionava-se, na Europa, por um lado, a possibilidade dos sistemas escolares tradicionais atenderem à crescente demanda social por educação e, por outro, sua incapacidade de atender às exigências do setor econômico, em rápido processo de implantação de novas formas de produção industrial. Como alternativa, valorizavam-se as formas não escolares (ou não formais) de educação, principalmente aquelas ligadas à formação e ao aperfeiçoamento profissional, e punha-se em evidência o papel educativo da própria sociedade (educação informal).

Estas discussões chegaram ao Brasil, no início dos anos de 1970, tanto pelos documentos da UNESCO, como pelos estudos da OCDE – Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico, e foram assumidas, com conotações específicas, no Parecer n. 669/72 do Conselho Federal de Educação. Embora considerasse o potencial educativo da sociedade e defendesse, em termos, a perspectiva da autoformação constante dos documentos internacionais, na verdade este parecer propôs uma “nova escola”, tanto para aqueles que tinham a escolaridade incompleta, como para os que almejavam validar a formação obtida na vida, em geral, e no trabalho, em particular.

Essa abrangência era prevista nas diversas funções atribuídas ao ensino supletivo, conforme a Lei n. 5.692/71: suplência – suprir a escolaridade regular para adolescentes e adultos que não a tinham seguido ou concluído na idade própria; suprimento – proporcionar, mediante repetidas voltas à escola, estudos de aperfeiçoamento ou especialização para os que tinham seguido o ensino regular no todo ou em parte”; aprendizagem – formação metódica no trabalho, a cargo das empresas ou instituiçoes por elas criadas e mantidas; qualificação – profissionalização associada à formação geral.

A função suplência, a mais desenvolvida pelo Ministério da Educação nos anos de 1970 até meados dos anos de 1980, compreendia cursos supletivos e exames, em nível de 1º e 2º graus. Os exames supletivos existiam na legislação educacional brasileira desde o século XIX, chamados “de madureza”, como exames de conclusão de estudos secundários. Esta designação teria sido oficializada pela Reforma Rui Barbosa, em 1882, para definir “um exame geral de admissão aos cursos superiores, no qual se averiguasse o grau de maturidade intelectual alcançado pelo adolescente”, tendo sido assumida nas reformas posteriores, até a Lei n. 4.024/61, as primeiras Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Eram, e ainda são, habitualmente utilizados para “encurtar” o tempo de conclusão do ensino médio. A unificação dos antigos ensinos primário e secundário em ensino de 1º grau, com oito anos de duração, efetivada por esta lei, fez crescer enormemente a procura dos exames supletivos nos anos de 1970, tendo em vista principalmente a exigência do certificado deste nível que passou a ser feita pelo mercado de trabalho. Os exames supletivos de 2º grau, atualmente ensino médio, em particular, atendiam, por um lado, à aspiração de acesso ao ensino superior e, por outro, à certificação da formação obtida na experiência profissional.

A designação cursos supletivos, por sua vez, foi inicialmente aplicada às classes de emergência noturnas da Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos implantadas em todo o país pelo Ministério da Educação e Saúde, de 1947 até meados da década de 1950. Sob a designação de educação de base, como proposta pela UNESCO, ou de educação rural, que as carências brasileiras passavam a exigir, essas classes de emergência ofereciam a alfabetização de adolescentes e adultos que nunca haviam frequentado uma escola e a escolarização em nível do antigo ensino primário.

Sobretudo nas capitais, os cursos supletivos aparecem como preparação aos exames, normalmente sob a responsabilidade de instituições privadas, nem sempre idôneas. Faz parte da experiência brasileira de educação também cursos alternativos, à margem do sistema de ensino regular, desenvolvidos por meio do rádio e da correspondência e, após os anos de 1960, pela televisão.

A aprendizagem e a qualificação profissional já estavam definidas, antes da Lei n. 5.692/71 e do Parecer n. 699/72, pelo SENAI/SESI e SENAC/SESC, instituições mantidas pelas entidades patronais, com recursos provenientes de contribuição recolhida nas folhas de pagamentos, tradicionalmente vinculados ao Ministério do Trabalho.

Nos anos de 1970, o MEC dedicou especial atenção ao ensino supletivo, principalmente na função suplência. Vários projetos de cursos foram elaborados e sistematizados o controle dos exames e da certificação, assim como do financiamento, a saber: Assistência Técnica aos Estados; Andrós: estudos, pesquisas e elaboração de material didático; Producere: preparação de pessoal para o ensino supletivo; Auxília: cooperação com os sistemas estaduais e municipais de educação no planejamento e na realização de cursos e exames supletivos; Logos I e II: habilitação de professores leigos em serviço; Centro de Estudos Supletivos (CES): formulação de metodologia própria para atender à clientela do ensino supletivo; Acesso: habilitação de pessoal já engajado na força de trabalho, em atividades técnicas; Programa de Assistência Educacional ao Atleta Profissional; Projeto de Educação Supletiva para a Saúde Previdenciária, além de projetos de outros órgãos do MEC por ele supervisionados: Minerva, pelo rádio, e Conquista, pela televisão, ambos para a 2ª fase do 1º grau.

No mesmo impulso, o próprio Departamento de Ensino Supletivo (DSU) financiou também estudos sobre os cursos e exames, abrindo fértil linha de pesquisa assumida principalmente por alguns mestrados em educação criados no período, entre eles o da PUC-Rio, da UnB e o IESAE/FGV, ao lado da Fundação Carlos Chagas, de São Paulo. O conjunto dessas pesquisas, disponíveis como relatórios ou dissertações e teses e também alguns como livros, foi analisado em dois estados da arte realizado o primeiro no CEDI – Centro Ecumênico de Informação e Documentação e o segundo na Ação Educativa, que o sucedeu, ambos coordenados por Sérgio Haddad e publicados pelo MEC/INEP.¹

Por sua vez, o DSU foi replicado em praticamente todas as secretarias de educação estaduais, com pessoal próprio e verbas específicas, conforme o modo de agir tradicional da União, impondo seus projetos nos estados e municípios. Efetivamente, o MOBRAL e o Ensino Supletivo foram implantados como sistemas paralelos ao ensino regular. Comparando os dois movimentos, é bastante maior o elenco de pesquisas sobre o ensino supletivo do que sobre as atividades do MOBRAL, embora este contasse com volume significativamente maior de recursos e maior área de atuação.

O acervo disponível no NEDEJA é bastante rico. No entanto, foram digitalizados apenas os documentos considerados significativos, mas toda a coleção está preservada para consulta. Compreende artigos, relatórios, teses e dissertações, livros e estados do conhecimento, ao lado de pareceres, deliberações e projetos do MEC, em geral editados pelo próprio DSU.

¹ As teses e dissertações analisadas no segundo estado da arte citado estão disponíveis na biblioteca digital da Ação Educativa: http://www.bdae.org.br/dspace/

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