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Educação de Jovens e Adultos

Educação de Jovens e Adultos

Este terceiro tópico, que complementa os dois anteriores sobre a Educação Popular, compreende três momentos distintos. Inicialmente, apresentam-se movimentos remanescentes do início dos anos de 1960 que se mantiveram praticamente até o final da década (Cruzada Ação Básica Cristã e SIREPA – Sistema Radioeducativo da Paraíba) e algumas iniciativas mais localizadas, vigentes na virada dos anos de 1960 para 1970 (Programas de Alfabetização Funcional no Nordeste e Projeto João de Barro, no Maranhão). Em segundo lugar, são apresentados os programas federais hegemônicos nos anos de 1970 e 1980 (MOBRAL, Ensino Supletivo e Fundação Educar), período mais forte dos governos autoritários. Em terceiro, apresentam-se experiências que tiveram início do final dos anos de 1970 ou início de 1980, durante a abertura democrática, inaugurando um novo modo de agir do estado na educação de jovens e adultos: Programa de Educação Juvenil, hoje Programa de Educação de Jovens e Adultos, do município do Rio de Janeiro; MOVA – Movimento de Alfabetização, criado na gestão de Luíza Erundina na Prefeitura de São Paulo e Paulo Freire, nos dias atuais com expressão nacional; Secretaria de Educação de Jovens e Adultos e MOVA de Porto Alegre e respectiva região metropolitana; além de duas experiências realizadas por universidades: Programa de Alfabetização de Funcionários da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Projeto Escola Zé Peão, criado em 1990 pelo Centro de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) em convênio com o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário de João Pessoa.

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O golpe militar de março de 1964 desestruturou praticamente todos os movimentos de cultura e educação popular que estavam em atividade e em franca expansão. Como instituição, apenas o MEB – Movimento de Educação de Base sobreviveu, pela cobertura da Igreja Católica. Algumas práticas, como a alfabetização realizada pelo Sistema Paulo Freire, foram mantidas, em formas isoladas e reservadas, até a promulgação do Ato Institucional, em dezembro 1968.

No entanto, uma experiência de caráter bastante conservador, a Cruzada de Ação Básica Cristã, mais conhecida como Cruzada ABC, foi reforçada após o golpe. Suas ações expandiram-se imediatamente no Grande Recife e foram logo após implantadas nos estados de Paraíba, Sergipe, Ceará, Alagoas, Rio de Janeiro e Guanabara, com recursos da Aliança para o Progresso e do governo brasileiro, mais doações de entidades privadas nacionais e internacionais, passando a atuar nas áreas que haviam sido influenciadas pela proposta de Paulo Freire e onde haviam sido instalados sindicatos rurais.

Mesmo secundarizado pela Cruzada ABC, o SIREPA – Sistema de Escolas Radiofônicas da Paraíba, criada em 1959, a partir do projeto SIRENA – Sistema Rádio Educativo Nacional, do MEC, conseguiu sobreviver até 1969, basicamente por limitar-se à alfabetização e por contar com apoio do governo do estado.

No elenco de novas ações nesse período, o governo do estado do Maranhão, aproveitando-se em parte do quadro profissional remanescente do MEB, criou, em 1967, o Projeto João de Barro, tendo em vista atender à alfabetização de adolescentes e adultos não escolarizados e implantar uma rede de escolas nas áreas rurais. Em 1974 foi substituído pelo MOBRAL.

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Nos dois anos seguintes ao golpe, o Governo Federal, além do relativo apoio à Cruzada ABC e ao MEB, praticamente ignorou a educação de adultos. Apenas de 1967 é apresentada nova proposta de alfabetização e adolescentes e adultos, atendendo à iniciativa da UNESCO de comemorar o dia 8 de setembro como Dia Internacional da Alfabetização. Vários decretos foram assinados em 08/09/67, criando um grupo interministerial para estudo e levantamento de recursos destinados à alfabetização; instituindo a Rede Nacional de Alfabetização e Educação Continuada de Adultos, que envolvia as emissoras radiofônicas e televisivas; prevendo a educação cívica e ações de alfabetização nas instituições sindicais e o uso da televisão. Complementando os decretos citados, em 15/12/67 foi promulgada a Lei n. 5379, pela qual é aprovado o Plano Nacional de Alfabetização Funcional e Educação Continuada de Adolescentes e Adultos e criado o MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização, como fundação sediada no Rio de Janeiro. Em 1968/1969, ligado ao DNE - Departamento Nacional de Educação e contanto com os funcionários do MEC que haviam feito as campanhas nacionais dos anos de 1940/1950, a orientação do recém-criado Movimento foi apoiar as iniciativas existentes (Cruzada ABC, MEB, Fundação Pe. Landell Moura), numa política de coordenação, e preparar a implantação do plano referido. Sua única atividade própria foi a produção de um programa de alfabetização a serem transmitidos pela Fundação Centro Brasileiro de Televisão Educativa, que não chegou a ser transmitido. Curiosamente, esse programa era baseado no livro-cartilha O Povo, preparado por Alfredina Paiva e Souza, cujas primeiras lições retomavam as situações de aprendizagem do livro de leitura Viver é Lutar, elaborado pelo MEB em 1963 e apreendido pela política de Carlos Lacerda, governador do estado da Guanabara, no início de 1964. No entanto, as lições posteriores desenvolvem argumentação radicalmente diferente.

A rigor experiência do MOBRAL tem início em 1970, com seu desligamento do Departamento Nacional de Educação e radical transformação de sua proposta inicial; passou a ser executor de amplo programa de alfabetização, desdobrado em vários programas complementares, com atuação em praticamente todos os municípios brasileiros. Em 1986, foi extinto e substituído pela Fundação Educar, que retomou a perspectiva de incentivo e apoio financeiro a iniciativas das secretarias de educação e de instituições privadas, definindo-se novamente como órgão de coordenação e não de execução. Realizou importante projeto de alfabetização de jovens e adultos, por meio de parcerias com entidades representativas dos movimentos populares da Baixada Fluminense (federações e associações de moradores, clubes de mães, comunidades eclesiais de base etc.), nos municípios de Duque de Caxias, Nova Iguaçu e São João de Meriti, de fevereiro de 1986 a março de 1990, período político de redemocratização do país e de fortalecimento e reconhecimento dos movimentos populares.

Nas mesmas décadas de 1970 e 1980, outro amplo programa foi desenvolvido pelo MEC: o Ensino Supletivo. A Lei n. 5692/71 dedicou-lhe um capítulo especial e sua formulação, em termos de política, foi feita pelo Parecer CNE n. 699/72, de autoria de Walnir Chagas. Ao longo dessas duas décadas, além de textos mais gerais: Diagnóstico do Ensino SupletivoEstratégia do Ensino Supletivo e documentos normativos, assim como sistemáticas relativas aos Exames Supletivos e aos Exames Supletivos Profissionalizantes, foram definidos e implantados vários projetos, entre eles: Acesso – Suplência Profissionalizante; Andrós – sistemática de módulos para ensino e material didático para cursos de qualificação profissional; Auxilia – Cursos e Exames Supletivos; Logos I e Logos II – formação de professoras leigas em exercício. Em especial, como um modelo alternativo às escolas regulares, foram criados os CES – Centros de Ensino Supletivo, alguns remanescentes até hoje, com a designação CEJA – Centros de Educação de Jovens e Adultos.

Com a retração do MEB – Movimento de Educação de Base, responsável pela programação educativa transmitida por várias emissoras católicas, e pela reserva de horários de todas as emissoras brasileiras a serem obrigatoriamente ocupados por transmissões educativas, no bojo do Ensino Supletivo foi criado o Projeto MINERVA, que teve pouca expressão nesse conjunto de ações. Por sua vez, os programas educativos a serem transmitidos pela televisão ficaram a cargo da Fundação João Batista do Amaral.

O DSU – Departamento de Ensino Supletivo do MEC foi replicado em praticamente todas as secretarias estaduais de educação, com pessoal destacado e verbas específicas para a implantação de sua estratégia e de seus projetos. Ao contrário da produção sobre o MOBRAL, é bastante farta a produção sobre o Ensino Supletivo, constante de relatórios de pesquisas, financiadas pelo próprio DESU, dissertações e teses, algumas publicadas em livros, e um estado da arte, elaborado por Sérgio Haddad e publicado pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais e pela REDUC – Rede Latino-Americana de Informação e Documentação em Educação, em 1987.

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Em meados dos anos de 1980, houve a extinção da Fundação Educar e a desativação do DESU, com a desaceleração da maioria de seus projetos. Por sua vez, o clima político da reabertura democrática, especialmente a conquista de várias administrações municipais por partidos de oposição, sobretudo pelo PT – Partido dos Trabalhadores, e a grande participação na Assembleia Nacional Constituinte, em 1987/1988, abriram novas perspectivas para a EJA. Foram retomadas e repensadas as propostas dos movimentos de cultura e educação popular do inicio dos anos de 1960, especialmente a pedagogia de Paulo Freire. Posteriormente, já nos anos de 1990, a divisão de responsabilidades entre as esferas do governo, com estímulo à municipalização, reforçou a importância das experiências feitas nos municípios, principalmente das capitais.

No período recente, três experiências são exemplares na concretização desses princípios: o PEJ - Programa de Educação Juvenil, hoje PEJA - Programa de Educação de Jovens e Adultos, no município do Rio de Janeiro; a política de EJA implantada em Porto Alegre, cuja melhor expressão é o CMET – Centro Municipal de Educação de Trabalhadores Paulo Freire; e o MOVA – Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos, organizado no município de São Paulo, durante a gestão de Luiza Erundina como prefeito e Paulo Freire como secretário de educação, posteriormente ampliado para todo o país.

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No Brasil, há importante produção sobre a educação de jovens e adultos. Entre as mais recentes, citamos: a monografia de Sérgio Haddad, Situação atual da EJA no Brasil – 2000/2005 (Patzcuáro, México: Crefal, 2008, em português e espanhol); a revista Em Aberto n. 82 - Educação de Jovens e Adultos (http://emaberto.inep.gov.br/), especialmente a seção Enfoque, preparada por Maria Margarida Machado, “A Educação de Jovens e Adultos no Brasil pós-Lei nº 9.394/96: a possibilidade de constituir-se como política pública”; o Documento Brasileiro e o Informe Nacional do Brasil, para a VI Confintea (Belém/PA, 2009); o dossiê sobre EJA organizado por Jane Paiva e Sandra Regina Sales para Arquivos Analíticos de Política Educacional.

Leia mais

O povo
Alfredina de Paiva e Souza

Situação atual da EJA no Brasil 
Sérgio Haddad

VI Confintea 
Documento preparatório nacional

VI Confintea 

Marco de ação de Belém

 

Educação de Jovens e Adultos 
Maria Margarida Machado (Org.
)

Dossiê I; Educação de Jovens e Adultos: aprendizagem no século 21

Dossiê II; Educação de Jovens e Adultos